Alta Tensão (França, 2003)


O cinema de horror dos últimos anos definitivamente voltou a explorar a violência de forma altamente perturbadora, numa linha parecida com aquela utilizada por muitos filmes insanos principalmente da década de 70. Pois, nesse início de século 21 já tivemos muitos exemplos de filmes que não poupam o público de cenas carregadas de atrocidades.
Alta Tensão” (Haute Tension) é um filme francês de 2003, dirigido pelo jovem cineasta Alexandre Aja (o mesmo da igualmente violenta refilmagem “Viagem Maldita”), e que foi lançado em DVD por aqui pela “Europa”. O filme é cru, visceral, insano, ousado, ofensivo, sangrento, só para citar alguns adjetivos pertinentes. Tem cenas fortes que inclui decapitação, uma vítima com o pescoço brutalmente dilacerado, uma outra com a carne destroçada por uma motosserra circular, e tudo filmado de forma incrivelmente realista, isso graças ao trabalho eficiente da equipe de efeitos especiais, liderada por um especialista nesta arte, o italiano Gianetto de Rossi, freqüente colaborador do cultuado cineasta Lucio Fulci.
O apreciador do cinema mais extremo não tem do reclamar, tendo em vista que muitos filmes perturbadores têm chegado ao circuito comercial no Brasil, seja diretamente no mercado de vídeo ou exibidos nas salas de projeção, estando à disposição de todos, desde o australiano “Wolf Creek – Viagem ao Inferno”, passando pelos americanos “O Albergue” e “Viagem Maldita” (todos lançados nos cinemas), até o inglês “Plataforma do Medo” e esse francês “Alta Tensão”, que foram direto para as locadoras de vídeo, somente para citar alguns casos onde prevalece o vermelho do sangue manchando as lentes das câmeras.

A história é simples e resume-se basicamente em duas belas jovens, Marie (Cécile de France) e sua amiga Alexia (Maiwenn Le Besco), que estão viajando de carro para a casa dos pais desta última, que fica localizada bem afastada numa região rural. O objetivo delas é poder aproveitar a tranqüilidade do ambiente do campo para estudar. Mas o que elas não imaginariam é que durante a noite, um homem rude, cruel e maníaco, sem maiores explicações, iria aparecer no sítio e invadir a casa instaurando um verdadeiro horror em seu estado mais absoluto, atormentando seus moradores com o uso de extrema violência, espalhando sangue e dor para todos os lados.

O filme tem poucos personagens e diálogos, e muito suspense nas cenas de perseguição em filmagens noturnas, com ênfase no confronto entre o assassino e uma sobrevivente da chacina, além também de uma reviravolta final que procura dar sentido aos eventos mostrados logo no início da história, tentando surpreender o espectador.
A trama pode até ser considerada banal e já vista em inúmeros filmes anteriores, mas a maior qualidade de “Alta Tensão” reside no fato do psicopata aparentar ser uma pessoa normal como outra qualquer, com a incrível diferença que é um assassino frio e ultra violento, não precisando ter o rosto deformado, usar máscara ou apresentar poderes sobrenaturais para demonstrar o quanto é insano e temível. É um homem maldito que age naturalmente, não poupando suas vítimas de mortes violentas. Não há sangue escorrendo durante toda a projeção, como por exemplo em “The Evil Dead” ou “Fome Animal”, mas nos momentos onde ocorrem as mortes, o roteiro faz questão de evidenciar a violência e a terrível dor das vítimas.
Resumindo, o cinema de horror e filmes como “Alta Tensão” são fascinantes justamente por conseguirem incomodar e perturbar o espectador levando-o a analisar e refletir sobre o quanto selvagem, insana e irracional pode ser a raça humana, e que nosso mundo deve mesmo ser apenas um inferno de algum outro planeta (confirmando uma idéia do escritor Aldous Huxley).

“Alta Tensão” (Haute Tension, França, 2003) # 397 – data: 30/08/06 – avaliação: 9,5 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 31/08/06)

Assombração (2006)


Para a sorte e satisfação dos apreciadores do cinema de Horror, as produções orientais do gênero (oriundas de países como Japão, China, Coréia do Sul, Hong Kong e Tailândia), estão chegando com bastante intensidade ao Brasil, invadindo principalmente o mercado de vídeo, e até com algumas delas entrando em cartaz nos cinemas, distribuídas pela “PlayArte”.
Já tivemos a exibição nas telas grandes brasileiras de filmes interessantes sobre fantasmas como “Visões” (The Eye 2) e “Espíritos – A Morte Está Ao Seu Lado” (Shutter), ambos de 2004. E agora estreou nos cinemas em 04/08/06 o filme “Assombração” (Gwai Wik / Re-Cycle, Hong Kong / Tailândia, 2006), dirigido pelos irmãos Oxide e Danny Pang e com a mesma bela atriz de “The Eye – A Herança”, Angelica Lee Sinje, numa história povoada de elementos perturbadores de horror como ambientes desoladores, espíritos atormentados, suicidas desorientados, mortos errantes e esquecidos, bebês abortados e todo tipo de habitantes de um mundo de pesadelo.

A jovem escritora Chu Xun (Angelica Lee Sinje), conquistou um grande sucesso entre os leitores com um livro que trata de uma história de amor que teve inspiração em sua própria experiência pessoal com uma paixão do passado, e que deixou marcas profundas em sua vida. Para incitar a curiosidade em seus fãs, seu agente Lawrence (Lawrence Chou), anuncia o próximo livro da autora num evento para a imprensa, revelando a mudança de temática para uma história sobrenatural sobre fantasmas, e que também poderia ter elementos baseados em sua vida real.
Quando Chu Xun inicia o trabalho com o livro, ela encontra muitas dificuldades de criação para começar a história, e seus problemas aumentam ainda mais quando passa a ter visões estranhas em sua casa, com o surgimento da silhueta de uma misteriosa mulher que se parece com a protagonista de seu novo livro, originando uma sucessão de eventos confusos em sua mente, dificultando separar a realidade da ficção e culminando com uma incrível viagem que ela faz por um mundo onírico dominado por um horror em estado absoluto.

“Assombração” é uma verdadeira viagem pelo inferno, por um mundo de desolação e pesadelo. Uma jornada tortuosa e obscura feita pela escritora Chu Xun, obrigada a passar por locais devastados e esquecidos pelo tempo como um parque de diversões sinistro, ou uma biblioteca repleta de livros velhos e cheios de poeira, ou uma dimensão coberta de brinquedos antigos e abandonados, ou uma região com uma ponte transitada por zumbis desorientados, ou uma caverna habitada por fetos e bebês deformados, ou uma floresta fantasmagórica com enforcados para todos os lados, ou ainda um triste cemitério com os mortos ao lado de suas lápides, lamentando por terem sido esquecidos e abandonados pela eternidade. E para encontrar uma saída desse universo caótico, ela teria que chegar até uma região chamada de “Transição”. Para sair do pesadelo, ela tem a ajuda de uma misteriosa garotinha de oito anos que encontrou pelo caminho e que conhece alguns dos segredos desse mundo desolador, e cada passagem deve ser percorrida em pouco tempo, pois rapidamente as várias dimensões macabras recebem uma espécie de “reciclagem” e tudo que estão nelas é desintegrado e destruído.
O filme tem boas doses de sustos, uma especialidade do cinema oriental, efeitos especiais eficientes (que não fica para trás dos americanos, que gostam de investir nesse quesito), um roteiro que desperta a atenção do espectador, incitando a participar da jornada sobrenatural da escritora, e um desfecho interessante, além de toda a ambientação convincente de um mundo povoado por fantasmas e criaturas perdidas em meio a um cenário de depressão. Outros fatores positivos são o ótimo trailer de divulgação, que reuniu imagens interessantes do filme e que aguçaram a curiosidade em conhecer a história, o também ótimo pôster principal, mostrando a escritora perdida num ambiente lúgubre e perseguida por uma legião de espíritos putrefatos, e também a criativa tagline promocional “Como fugir de um pesadelo criado por você mesmo?”.
Porém, temos um ponto desfavorável: após uma revelação importante sobre a relação entre a escritora e a menina que a acompanha pela viagem nesse mundo distorcido, o roteiro exagerou na carga dramática, se afastando demais de todo aquele clima mórbido que envolvia a trama, mas nada que atrapalhe de forma significativa, tanto que no saldo final, “Assombração” é mais um dos vários bons filmes orientais de horror produzidos nesse início de século XXI, mostrando toda a força e potencial que o gênero ainda possui, despertando a admiração do público que acompanha o estilo.

A “PlayArte” está tendo o mérito de lançar nos cinemas e em vídeo vários filmes orientais interessantes no gênero Horror, porém a distribuidora também é conhecida por escolher péssimos títulos nacionais. Os responsáveis por nomear os filmes que chegam por aqui conseguem demonstrar uma incrível incompetência e cada vez superando-se ainda mais. Para comprovar isso, basta lembrar alguns poucos exemplos como o violento “Pânico na Floresta” (Wrong Turn, 2003), e três filmes já citados nesse texto: “Visões”, que na verdade é a continuação de “The Eye – A Herança”; “Shutter”, que recebeu o enorme, super manjado e sensacionalista título “Espíritos – A Morte Está Ao Seu Lado”; e agora esse “Assombração”, que é igualmente um nome óbvio demais, comercial demais e inadequado demais, pois o melhor seria apenas traduzir o original em inglês, algo como “Reciclagem”, que tem relações diretas com acontecimentos da história do filme.
Um detalhe interessante e que gostaria de registrar é que na sessão em que assisti “Assombração”, a sala estava cheia e as pessoas estavam lá para ver um filme oriental de horror em vez das tradicionais produções americanas, muito parecidas entre si, repletas de clichês cansativos e com pouca ousadia em suas histórias na maioria das vezes (claro que temos boas exceções como “O Albergue” e “Viagem Maldita”, entre outros).
Outro fato que merece registro é que não é só a “PlayArte” que precisa de um alerta de reprovação (na escolha ruim dos títulos nacionais), pois parte do público que freqüenta os cinemas é formada por aqueles adolescentes acéfalos e sem educação, que não respeitam um lugar público, atrapalhando quem quer ver o filme em paz, através de conversas e comentários inoportunos e em tom alto. Sinceramente (e acredito que muitos concordarão comigo), o mundo dos cinéfilos seria muito melhor sem essas criaturas indesejáveis freqüentando as salas dos cinemas.

“Assombração” (Gwai Wik / Re-Cycle, Hong Kong / Tailândia, 2006) # 396 – data: 06/08/06 – avaliação: 8 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 07/08/06)

Prelúdio Para Matar (1975)


A Editora “Works”, de Jundiaí/SP, responsável pelo selo “Dark Side”, uma coleção de filmes de horror lançados em DVD no Brasil, certamente fez um grande benefício aos colecionadores distribuindo uma infinidade de títulos obrigatórios e indispensáveis como “A Casa dos Maus Espíritos” (House on Haunted Hill, 58), de William Castle e com Vincent Price, “Despertar dos Mortos” (Dawn of the Dead, 78), de George Romero, e “O Homem de Palha” (The Wicker Man, 73), com Christopher Lee e Ingrid Pitt, entre outros, além de várias preciosidades do estúdio inglês “Hammer”, como “Drácula – O Príncipe das Trevas” (66), de Terence Fisher. É claro que fazem parte também do catálogo da editora, filmes menores e descartáveis como “Pelotão Vampiro” (91), “Invasão Mortal” (95) e “Werewolf – A Noite do Lobo” (96), somente para citar algumas tranqueiras. Mas, no geral, a “Dark Side” é uma coleção admirável, composta por filmes que merecem constar no acervo de qualquer colecionador do gênero.
Porém, vale registrar um erro grosseiro cometido pelos responsáveis da editora: o DVD de “Prelúdio Para Matar” (Profondo Rosso / Deep Red, Itália, 1975), dirigido por Dario Argento e escrito por ele em parceria com Bernardino Zapponi, está com um defeito grave nas legendas, pois muitas cenas faladas em italiano estão sem as legendas em português. Somente as passagens em inglês estão legendadas. Por sorte, a falha não chega a comprometer o entendimento do roteiro, desse que é um dos mais importantes thrillers da carreira do cineasta Dario Argento (responsável também por “Suspiria”, 77), com uma trama de assassinatos bastante envolvente (apesar da narrativa excessivamente lenta em certos momentos no decorrer dos 126 minutos de duração), mortes sangrentas carregadas de tensão e violência, e um desfecho interessante, amarrando satisfatoriamente todos os detalhes que foram apresentados aos poucos.
Mas, a falta de legendas em português em muitos diálogos em italiano certamente prejudicaram a diversão do espectador, causando um desconforto significativo e uma irritação inevitável, principalmente por se tratar de um erro na produção do DVD (algo que poderia ser facilmente evitado com uma atenção maior na revisão), uma vez que está anunciado na contra capa do estojo que o idioma original é o inglês e que há a opção de legendas em português. E na verdade há uma mistura de inglês com italiano e sem legendas durante longos minutos.

Na história, um pianista inglês chamado Marcus Daly (David Hemmings) é testemunha de um assassinato extremamente brutal envolvendo como vítima uma bela mulher com poderes de telepatia, Helga Ulmann (Macha Méril), e que havia se tornado uma ameaça ao assassino por sentir sua presença e influência maligna durante uma conferência para debater sua capacidade mediúnica.
Intrigado pela violência do ato, o pianista decide investigar o responsável pelo crime hediondo agindo por conta própria, contando apenas com o auxílio de uma jornalista em busca de notícia, Gianna Brezzi (Daria Nicolodi, atriz presente em vários filmes de Dario Argento). Enquanto eles tentam descobrir a identidade do criminoso, outras pessoas com envolvimentos na trama são também brutalmente mortas, até culminar num inevitável confronto decisivo entre o pianista e o assassino.

“Prelúdio Para Matar” é um dos principais representantes dos chamados giallos, a expressão que identifica os filmes italianos sobre mistérios e assassinatos. O nome, que significa “amarelo”, é inspirado nas capas dessa cor, um fato constante em livros populares sobre esse estilo literário que sempre conquistou a atenção e curiosidade do público. Como uma boa história de investigação e assassinatos, não faltam cenas gráficas de mortes violentas com facadas, queimaduras no rosto, cabeça esmagada, pescoço degolado e uma boa dose do “vermelho profundo” do sangue, conforme sugere o título original italiano (“Profondo Rosso”) e a tradução em inglês (“Deep Red”), que aliás são bem melhores e mais apropriados que a escolha do nacional “Prelúdio Para Matar”.
O filme foi lançado nas bancas encartado na revista “Cine Monstro” ano 2 número 8 (Março de 2006), sem materiais extras. Já a revista traz artigos sobre o filme em questão, um guia com a filmografia dos giallos entre os anos 1960 a 2004, resenhas de “Cry Wolf – O Jogo da Mentira” e “A Névoa” (refilmagem de “A Bruma Assassina”, de John Carpenter), matéria sobre o lançamento em DVD do clássico “Com a Maldade na Alma” (1964), com Bette Davis, Olivia de Havilland, Agnes Moorehead e Joseph Cotten, micro resenhas de seis DVD´s disponíveis nas locadoras, além de um cartaz original de “Prelúdio Para Matar”.

“Prelúdio Para Matar” (Profondo Rosso / Deep Red / The Hatchet Murders, Itália, 1975) # 395
data: 06/08/06 – avaliação: 9 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 07/08/06)