Celular - Um Grito de Socorro (2004)


Na sexta-feira 12/11/04 chegou ao Brasil o suspense “Celular – Um Grito de Socorro” (Cellular), entrando em cartaz em nossos cinemas com distribuição da “PlayArte”, dirigido por David R. Ellis (de “Premonição 2”), roteiro escrito a partir de uma história de Larry Cohen (de “Por Um Fio”) e com produção de Dean Devlin (de “Malditas Aranhas!).

Uma mulher, a professora de Biologia Jessica Martin (Kim Basinger, de “A Filha da Luz”), é sequestrada e mantida presa num cativeiro, com sua vida ameaçada pelo líder dos criminosos, Ethan Greer (o inglês Jason Statham, de “Fantasmas de Marte”). Porém, ela consegue ainda fazer uma última ligação com os restos de um telefone destruído pelos bandidos que a raptaram. Discando para um número aleatório, ela acaba entrando em contato com um jovem, Ryan (Chris Evans), através de seu telefone celular. Inicialmente, ele acredita que a ligação é uma brincadeira por causa da solicitação desesperada de Jessica em pedir socorro, mas depois o jovem se convence da seriedade do caso quando ouve de fundo a voz ameaçadora do sequestrador intimidando a mulher.
A partir daí, Chris tenta ajudá-la de todas as formas possíveis, procurando pistas sobre seu cativeiro e tentando evitar os sequestros também de seu filho pequeno, Ricky (Adam Taylor Gordon), e do marido corretor de imóveis Craig (Richard Burgi), além principalmente de manter ativa a todo custo a ligação do celular que é o único elo de comunicação com Jessica. Para isso, ele enfrenta inúmeros problemas como o fim da carga da bateria do aparelho, que o obriga a cometer uma série de infrações na cidade, como acidentes de trânsito, roubo de carros (especialmente um valioso Porsche azul de um advogado arrogante e responsável por várias cenas engraçadas), além de ameaças públicas com um revólver, despertando a atenção da polícia através do Sargento Bob Mooney (William H. Macy, de “A Vida em Preto e Branco”), que estava cansado da rotina burocrática de seu trabalho há longos vinte e sete anos, prestes a se aposentar da corporação, e nem imaginaria a confusão em que iria se meter ao investigar o misterioso sequestro da Sra. Jessica Martin.

O subtítulo do filme, “Um Grito de Socorro”, poderia ser talvez melhor aplicado como o desejo do espectador para ser resgatado da sala de cinema em reação e protesto contra a infinidade de furos e situações forçadas do roteiro (típicas do fantasioso “mundo do cinema”), em vez de representar a agonia da personagem Jessica Martin pedindo auxílio para se livrar dos sequestradores que ameaçam sua vida num cativeiro. Brincadeiras à parte, “Celular” até que consegue divertir um pouco em sua hora e meia de projeção desde que não sejamos exigentes com as várias cenas absurdas da história, que já parte de uma premissa altamente inverossímil, ou seja, a possibilidade de uma simples mulher em estado de desespero conseguir fazer uma chamada telefônica com os restos destruídos de um aparelho, entrando em contato com uma pessoa qualquer, que por sua vez, passa de um patético jovem mais interessado em ver mulheres em trajes de banho no Cais Santa Monica, em Los Angeles, para alguém com uma repentina e notória coragem e habilidades especiais para enfrentar uma situação completamente fora do comum, cometendo uma série de incidentes na cidade para alcançar seu objetivo, fazendo da polícia uma instituição desnecessária e incompetente.
Mas, independente disso, e procurando apenas se envolver com a história e o drama enfrentado pela mulher sequestrada e pelo jovem que tenta ajudá-la com um celular no ouvido o tempo todo, o filme tem alguns bons momentos de ação e suspense com intensas perseguições de carro, tiroteios e correrias desenfreadas, incitando o público a tentar descobrir o real mistério por trás do sequestro, acompanhando o desafio de Ryan em evitar a queda da ligação do celular e sua tentativa de salvar a vida da família de Jessica das mãos dos perigosos bandidos.

Entre as curiosidades, vale mencionar uma referência à popular saga “O Senhor dos Anéis”, através da bolsa de escola do garoto Ricky Martin, um dos diversos produtos de merchandise da franquia, além de uma cena onde na casa dos raptores podemos ver na televisão um trecho rápido da sequência do grave acidente rodoviário de “Premonição 2” (Final Destination 2, 2003), filme do mesmo estúdio “New Line Cinema” e também dirigido por David R. Ellis.
O cineasta e escritor Larry Cohen é bem conhecido no gênero fantástico, tendo participação em muitos filmes “B” de horror e suspense, seja na direção ou roteiro, como é o caso do divertido “A Coisa” (85) e as franquias “Nasce Um Monstro” (iniciada nos anos 70) e “Maniac Cop” (do final da década de 80). Curiosamente ele também é o autor de “Por Um Fio” (Phone Booth, 2002), cuja história é muito similar à de “Celular – Um Grito de Socorro”, com a diferença que no primeiro filme um homem (Colin Farrell) é mantido preso numa cabine telefônica pública sob a mira de um franco atirador (Kiefer Sutherland), recebendo a ajuda e orientação de um policial (Forest Whitaker). Já no segundo filme, uma mulher é sequestrada e pede ajuda para um homem através de um celular, e este tenta socorrê-la ficando grudado no telefone móvel o tempo todo, com a vantagem de poder se locomover à vontade, permitindo com isso cometer vários distúrbios urbanos e chamando a atenção para a investigação de um policial.
“Celular – Um Grito de Socorro” tem como um dos personagens principais um celular, que é o centro das atenções e o objeto que interliga todas as ações e elementos do filme, explorando como tema básico esse aparelho cada vez mais popular e um dos maiores representantes da atual modernidade tecnológica, assim como a internet que tanto já foi utilizada como tema de uma enorme quantidade de filmes de todos os gêneros, muitos deles dentro do horror.
A responsável pela distribuição de “Celular – Um Grito de Socorro” no Brasil é a “PlayArte”, conhecida por escolher muito mal o nome dos filmes que chegam por aqui. Novamente errou ao colocar um desnecessário subtítulo (Um Grito de Socorro), sendo muito mais fácil apenas traduzir o original para “Celular”. Outros equívocos grotescos da distribuidora são por exemplo os nomes nacionais de “Wrong Turn” para o manjado “Pânico na Floresta” ou o road movie de horror “Highwaymen” para o oportunista “Velozes e Mortais”.

“Celular – Um Grito de Socorro” (Cellular, 2004) # 283 – data: 15/11/04 – avaliação: 5 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 31/01/06)

Celular – Um Grito de Socorro (Cellular, Estados Unidos, 2004). Duração: 94 minutos. New Line Cinema / PlayArte. Direção de David R. Ellis. Roteiro de Chris Morgan, baseado em história de Larry Cohen (roteiro reescrito por Eric Bress e J. MacKye Gruber e não creditados). Produção de Dean Devlin, Lauren Lloyd e Marc Roskin. Produção Executiva de Douglas Curtis e Keith Goldberg. Fotografia de Gary Capo. Música de John Ottman. Edição de Eric A. Sears. Desenho de Produção de Jaymes Hinkle. Direção de Arte de Domenic Silvestri. Elenco: Kim Basinger (Jessica Martin), Chris Evans (Ryan), William H. Macy (Sargento Bob Mooney), Eric Christian Olsen (Chad), Jessica Biel (Chloe), Jason Statham (Ethan Greer), Richard Burgi (Craig Martin), Eddie Driscoll (Ronnie), Eric Etebari (Dimitri), Adam Taylor Gordon (Ricky Martin), Noah Emmerich (Jack Tanner).

Capitão Sky e o Mundo de Amanhã (2004)


Cinema basicamente é sinônimo de diversão, ou seja, um dos nossos maiores objetivos ao assistir um filme é encontrarmos entretenimento. E o gênero fantástico (horror, suspense, ficção científica e fantasia) é aquele que mais oferece oportunidades para atingirmos essa finalidade, principalmente através daquelas histórias despretensiosas ambientadas no universo da imaginação. Esse é o caso de “Capitão Sky e o Mundo de Amanhã” (Sky Captain and the World of Tomorrow), uma aventura com elementos de FC e fantasia escrita e dirigida pelo estreante Kerry Conran, e que entrou em cartaz nos cinemas brasileiros em 19/11/04.

A história é ambientada na New York de 1939, onde a repórter e fotógrafa do jornal “Chronicle” Polly Perkins (a bela Gwyneth Paltrow) está investigando o desaparecimento de vários cientistas famosos ao redor do mundo. Quando a cidade enfrenta uma invasão e ataque de um exército de robôs gigantes voadores, ela se une ao ex-namorado Joseph Sullivan (Jude Law), também conhecido como o Capitão Sky, um destemido piloto de avião líder de um grupo de mercenários, para juntos tentarem descobrir o paradeiro do provável responsável pelos ataques dos robôs, um cientista “louco” chamado Dr. Totenkopf (Sir Laurence Olivier, em imagens de arquivo), que planeja destruir o mundo e está refugiado numa ilha em algum lugar no Nepal.
Para alcançar sua missão (a jornalista, em encontrar um furo de reportagem, e o piloto, em salvar o mundo das garras de um tirano), o casal de aventureiros conta também com a ajuda de um brilhante e jovem cientista, Dex Dearborn (Giovanni Ribisi), melhor amigo e fiel escudeiro do Capitão Sky, além de uma bela piloto, Capitã Franky Cook (Angelina Jolie), comandante de uma base secreta aérea (uma fortaleza voadora que serve de porta-aviões) e líder de um esquadrão anfíbio, com quem o Capitão Sky também teve um relacionamento amoroso no passado.
Após enfrentarem uma série de aventuras perigosas, desde o ataque de robôs com enormes tentáculos, passando por máquinas voadoras que possuem asas que se movimentam como a de pássaros, além de turbulentos passeios subaquáticos e encontros desagradáveis com uma vilã conhecida como “a mulher misteriosa” (Bai Ling), entre outras atividades não menos mortais, o casal de heróis encontra o imenso esconderijo do Dr. Totenkopf e tenta impedir seu plano maquiavélico de punir o planeta, fazendo justiça com as próprias mãos.

“Capitão Sky e o Mundo de Amanhã” é uma grande mistura de ação, aventura, ficção científica e fantasia, com elementos dos antigos filmes noir, seriados dos anos 40 e aquelas histórias em quadrinhos com cientistas loucos tentando dominar o mundo utilizando engenhocas futuristas. E o resultado da soma de tudo isso é a mais pura diversão sem compromisso, levando-se em conta a proposta de uma história despretensiosa de nostalgia repleta das típicas fantasias do mundo do cinema.
A fotografia é carregada num tom sépia para lembrar o cinema do passado, e o universo ficcional criado para o filme possui elementos que simulam uma ambientação na New York do final dos anos 30 com variações históricas, já que não é feita nenhuma menção à Segunda Guerra Mundial, cujo conflito estava se iniciando, nem também referências à depressão econômica que os Estados Unidos enfrentavam nessa época. Porém, a tecnologia do período era completamente baseada em elementos futuristas, representados por robôs de todos os tipos e tamanhos, que voam e disparam raios destruidores, além de máquinas voadoras e aviões sofisticados que também se locomovem na água, gigantescos porta-aviões que pairam no ar, e até uma imenso foguete espacial típico dos filmes de ficção científica dos anos 50.
Uma simples palavra que define muito bem o filme é a mesma que eu disse para um pesquisador de um conceituado jornal que estava entrevistando os espectadores na saída da sala do cinema, na rede Cinemark do Shopping Center Interlagos, em São Paulo. Ele apenas perguntou o que eu achava do filme, com as opções de ótimo, bom, regular, ruim ou péssimo. A resposta foi rápida, curta e grossa: ÓTIMO.

Uma enorme quantidade de referências e homenagens desfilam por todo o filme, além de uma infinidade de curiosidades de bastidores. “Capitão Sky e o Mundo de Amanhã” teve um orçamento aproximado de US$ 70 milhões e foi filmado totalmente com os atores interpretando seus respectivos personagens em frente de uma tela azul, onde somente depois foram acrescentados através de efeitos de computadores os cenários e todo um mundo virtual em três dimensões. Sendo que o próprio cineasta Kerry Conran é o criador do programa que permitiu unir atores de verdade com um ambiente de total fantasia. Pelo fato das filmagens com os atores serem simples, atuando em frente da tela azul, foram necessários apenas vinte e seis dias para a conclusão dos trabalhos, e como a atriz Angelina Jolie, um dos três grandes nomes de peso do elenco, teve uma participação rápida com seu personagem Franky Cook, ela precisou apenas de três dias para filmar suas cenas.
O nome do filme originalmente seria apenas “The World of Tomorrow”, uma referência a um utópico mundo de amanhã idealizado pelo Dr. Totenkopf, que acreditava que o planeta estava destinado numa auto destruição pelas guerras. Mas depois o título mudou para o definitivo “Sky Captain and the World of Tomorrow” para não haver qualquer tipo de conflito e confusão do público com um outro filme igualmente milionário e produzido ao mesmo tempo, “O Dia Depois de Amanhã” (The Day After Tomorrow), com Dennis Quaid.
Várias taglines promocionais foram criadas para o trabalho de marketing do filme, e traduzindo algumas delas seriam “Junte-se à resistência”, “O mundo tremerá”, “Quem irá nos salvar?” e “A batalha pelo amanhã está para começar...”.
Aliás, falando em começo, a idéia inicial de Conran era filmar apenas um curta metragem de seis minutos, mostrando um ataque de robôs gigantes voadores à cidade de New York utilizando sua técnica com CGI, porém o produtor Jon Avnet gostou tanto do resultado que decidiu financiar um projeto maior, convencendo o cineasta a fazer um filme mais longo.
O ator Sir Laurence Olivier morreu em 1989, mas através do resgate de imagens de arquivo de seus filmes dos anos 40 e com o auxílio de modernas técnicas de efeitos digitais, foi possível criar uma condição que simulasse sua presença como o vilão “cientista louco” Dr. Totenkopf, em rápidas cenas onde ele fala apenas algumas frases.
O belíssimo e imenso foguete espacial visto na sequência final e que serviria como uma espécie de “Arca de Noé”, possui referências diretas aos clássicos de FC “Destino à Lua” (Destination Moon, 50) e “Colisão de Planetas” (When Worlds Collide, 51), ambos produzidos por George Pal. Nesse mesmo foguete, existe uma cena onde o Capitão Sky e a repórter Polly estão caminhando em seu vasto interior, e os cenários são uma referência ao maquinário futurista da avançada civilização Krell em “Planeta Proibido” (Forbidden Planet, 56), um dos maiores filmes de FC de todos os tempos, com um elenco formado por Walter Pidgeon, Leslie Nielsen e Anne Francis, além de introduzir o famoso robô Robby no imaginário popular dos fãs do cinema fantástico.
Em várias outras cenas existem citações a filmes como “King Kong” (33), nas sequências ambientadas numa ilha selvagem repleta de animais mutantes e pré-históricos (reparem numa árvore enorme que serve de ponte e rota de fuga para os protagonistas); “O Mágico de Oz” (39), que estava sendo exibido num famoso cinema local (“Radio City Music Hall”) onde a repórter Polly se encontra com um cientista; “A Guerra dos Mundos” (53), nos ruídos característicos dos disparos dos raios destruidores dos robôs gigantes que atacaram New York quando tentavam recuperar alguns geradores de energia, cujos sons foram reproduzidos das máquinas voadoras marcianas que invadiram a Terra no filme baseado na obra de H. G. Wells; e “THX 1138” (71), de George Lucas, onde na porta do laboratório do cientista Dr. Walter Jennings (Trevor Baxter) estava o número 1138. Isso sem falar em “Metropolis”, “Flash Gordon”, “Guerra nas Estrelas: O Império Contra-Ataca”, e outros mais...
Além também de citações ao popular monstro japonês Godzilla (que aparece rapidamente num jornal de Tokyo), ao lendário estúdio “RKO Radio Pictures” (através de seu tradicional logotipo representando uma torre imensa no topo do mundo que emite sinais de rádio), ao histórico navio Titanic (que aparece naufragado num cemitério de embarcações quando o Capitão Sky pilotava seu avião embaixo d´água rumo à ilha do Dr. Totenkopf). E personalidades do mundo do cinema como o diretor Orson Wells, que adaptou “A Guerra dos Mundos” para o rádio em 1938 e que foi homenageado pela repórter Polly Perkins quando reproduziu as mesmas falas de um trecho da novela radiofônica ao informar num telefone para seu editor Morris Paley (Michael Gambon) a invasão dos robôs gigantes. Sem contar os inúmeros profissionais da equipe de produção do próprio filme, cujos nomes aparecem rapidamente como autores de artigos num jornal, entre eles, a produtora Marsha Oglesby, o desenhista de produção Kevin Conran (irmão do diretor) e o supervisor dos efeitos visuais Darin Hollings.

“Capitão Sky e o Mundo de Amanhã” (Sky Captain and the World of Tomorrow, 2004) # 284 – data: 21/11/04 – avaliação: 9 (de 0 a 10) – site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 31/01/06)

Capitão Sky e o Mundo de Amanhã (Sky Captain and the World of Tomorrow, Estados Unidos / Inglaterra / Itália, 2004). Duração: 106 minutos. Distribuição: Paramount / Warner Bros. Direção e roteiro de Kerry Conran. Produção de Jon Avnet, Sadie Frost, Jude Law, Marsha Oglesby, Hester Hargett e Brooke Breton. Produção Executiva de Aurelio De Laurentiis, Raffaella De Laurentiis e Bill Haber. Fotografia de Eric Adkins. Música de Robert Elhai e Ed Shearmur. Edição de Sabrina Plisco. Desenho de Produção de Kevin Conran. Efeitos Visuais de Darin Hollings. Elenco: Jude Law (Joe “Capitão Sky” Sullivan), Gwyneth Paltrow (Polly Perkins), Angelina Jolie (Capitã Francesca Cook), Giovanni Ribisi (Dex Dearborn), Michael Gambon (Morris Paley), Omid Djalili (Kaji), Trevor Baxter (Dr. Walter Jennings), Julian Curry (Dr. Jorge Vargas), Sir Laurence Olivier (Dr. Totenkopf, em imagens de arquivo), Bai Ling (Mulher Misteriosa), Khan Bonfils, Peter Law, Mark Wells.

Canibais (Undead, Austrália, 2003)


Os “zumbis” são um dos mais interessantes subgêneros do cinema de horror, principalmente depois do cineasta George Romero lançar o cultuado clássico fotografado em preto e branco “A Noite dos Mortos Vivos” em 1968, filme seguido por outros como “Despertar dos Mortos” (78), “O Dia dos Mortos” (85) e "Terra dos Mortos" (2005). E apesar de ser um tema muito explorado e desgastado, ainda consegue atrair atenção de forma significativa além de possuir um incrível potencial para ser utilizado em filmes que são produzidos todos os anos ao redor do mundo. Um exemplo positivo de mais uma história de zumbis vem da Austrália, com o título nacional “Canibais” (Undead, 2003), uma produção independente de baixo orçamento dirigida, escrita e produzida pelos irmãos Michael e Peter Spierig.

O argumento apresenta uma mistura de horror explícito repleto de sangue, vísceras e desmembramentos em profusão, com elementos de ficção científica e alienígenas, não apresentando grandes novidades, mas investindo num roteiro divertido infestado de cenas hilariantes e um estilo que homenageia os filmes de mortos vivos do passado e as produções baratas de FC com suas histórias sobre contatos extraterrestres, invasões e epidemias fora de controle.
Uma pequena cidade do interior da Austrália, Berkeley, cujos habitantes procuram viver suas vidas da forma mais pacata possível, repentinamente é assolada por uma chuva de meteoritos que ao contato com seres vivos, tanto os humanos quanto os animais, espalha uma doença que os transforma em mortos vivos famintos por carne e cérebro. Um pequeno grupo de seis sobreviventes se forma aleatoriamente e ao tentarem fugir dos zumbis lutando por suas vidas acabam se refugiando nos porões de uma casa de campo (no melhor estilo “A Noite dos Mortos Vivos”), onde eles tem o desafio de controlar suas emoções para tentarem entender o que está acontecendo e sobreviver em meio ao caos que se instaurou na cidade, além de conseguirem o mais difícil, administrar seus próprios conflitos internos.
O grupo é formado pelo estranho Marion (Mungo McKay), um pescador dono de uma loja de armas e também proprietário da casa onde estão isolados; pela bela Rene Chaplin (Felicity Mason), que estava querendo abandonar a cidade após perder a fazenda de seus pais falecidos devido a uma dívida para uma instituição financeira; pelo casal Wayne Wipple (Rob Jenkins), dono de uma pequena empresa de turismo que faz vôos fretados, e sua esposa grávida Sallyanne (Lisa Cunningham), que tem inveja de Rene por ela ter ganho um concurso de beleza da cidade; além de uma dupla de policiais formada pelo histérico Sargento Harrison (Dirk Hunter), que adora gritar para impor seu autoritarismo como o representante da lei, e sua parceira submissa Molly (Emma Randall), que apenas segue os passos de seu superior e enfrenta regulares crises de asma quando está nervosa.
Eles são obrigados a sair da casa por causa da gravidez de Sallyanne e enfrentam zumbis interessados em devorar suas carnes, com direito a tiroteios, correrias, gritarias, abduções, banhos de chuva ácida, corpos dilacerados, vísceras penduradas e muito sangue manchando a tela de vermelho, além de uma série de revelações que mostram que a tragédia que se abateu em Berkeley pode não ser apenas uma epidemia de zumbis causada pela queda dos meteoritos vindos do espaço sideral.

Não faltam cenas sangrentas e de extrema violência, como por exemplo quando uma garota zumbi simplesmente arranca com uma das mãos o cérebro de uma mulher, e o devora tranquilamente. Além de um outro zumbi ser literalmente cortado ao meio pelo disparo de uma arma especial tripla projetada por Marion, arremessando a parte superior do infeliz morto vivo dezenas de metros longe, deixando seu quadril e pernas andando sozinho e sem rumo.
A fotografia é bastante escura a maior parte do tempo, para facilitar os trabalhos dos efeitos visuais, escondendo melhor suas falhas, com o roteiro tratando de justificar a escuridão com um isolamento da cidade, incluindo enormes muros ao seu redor e nuvens espessas e sombrias cobrindo tudo. O filme possui alguns exageros, principalmente no combate aos zumbis, onde o pescador Marion demonstra suas incríveis habilidades no manuseio de armas de fogo, além de uma notável agilidade física em movimentos bastante improváveis.
Mas, de uma forma geral, “Canibais” garante um ótimo entretenimento pois é um filme de zumbis com muito sangue e violência, momentos hilários muito engraçados, uma história que apesar de investir em clichês básicos do gênero ainda consegue despertar interesse num crossover com elementos de FC, além do charme de ser uma produção independente fora do tradicional mercado americano, gerada com recursos próprios pelos irmãos Spierig, que fazem de tudo, desde a direção aos efeitos visuais.

“Canibais” foi lançado no mercado brasileiro de vídeo VHS e DVD no final de 2003 pela “Alpha Filmes”. Entre as várias e interessantes curiosidades sobre o filme e os bastidores, destacamos o fato de ser uma produção de baixo orçamento, algo em torno de US$ 1 milhão, que é pouco quando comparado com outros filmes similares sobre zumbis feitos na mesma época como por exemplo a franquia “Resident Evil”. Uma das características que comprovam sua condição de independente é que os irmãos australianos Michael e Peter Spierig são multifuncionais na equipe técnica, assumindo a direção, construção da história, produção com recursos próprios (e com a ajuda de amigos e familiares), os trabalhos de edição e a criação e supervisão dos efeitos visuais utilizando seus computadores pessoais em cerca de nove meses de pós produção. Por causa da limitação do orçamento disponível, muitas cenas foram feitas em tomadas únicas, sendo que os atores (todos desconhecidos) ensaiaram suas atuações durante dois meses antes do início das filmagens. E para garantir uma imensa quantidade do vital líquido vermelho jorrando para todos os lados, foram utilizados mais de seiscentos litros de sangue falso.
Mais um detalhe curioso foi que no roteiro original não havia palavras de baixo calão e que todos os muitos xingamentos proferidos ao longo do filme foram improvisados pelos atores. Aliás, isso foi uma das coisas que ajudaram a tornar o filme ainda mais hilário em determinadas cenas, principalmente quando o histérico Sargento Harrison gritava um monte de bobagens contra seus companheiros e para os zumbis canibais que estavam atrás de sua carne e cérebro. Coisas do tipo (conforme a tradução das legendas): “Seu cabeça de titica de macaco morto!”, ou “Ninguém vai morrer hoje! Não no meu turno!”, ou ainda os incontáveis “fuck” que acompanhavam quase todas as frases que falava. Certamente foi o personagem mais engraçado da história, um policial tão paranóico que cujo comportamento descontrolado transmitia uma sensação ainda maior de insegurança ao grupo, frente à horda de zumbis carnívoros que os ameaçavam.
Outro personagem marcante foi o pescador Marion, também dono de uma loja de armas de fogo, que foi o protagonista de uma sequência extremamente hilária num confronto contra peixes zumbis que ele havia capturado momentos antes de serem atingidos por um meteorito e consequentemente infectados com a praga que os transformaria em mortos vivos. Os peixes zumbis saltavam em direção ao rosto de Marion e somente eram abatidos com disparos de um revólver que estraçalhavam seus corpos. Ele usa um chapéu enorme e veste roupas típicas de um morador de uma pequena cidade do interior, combatendo os zumbis com uma arma especial composta por três canos grossos e longos (sua figura ilustra a capa do vídeo). Sem contar que todas as suas frases são ditas numa frieza e calmaria tão incomuns, principalmente para aquela situação tensa de invasão de zumbis carnívoros, que acabam tornando-o completamente sinistro e misterioso.
Nota do Autor (10/07/10): O filme também foi distribuído no mercado de DVD´s piratas com o nome de “Canibal”, trazendo uma capa diferente da lançada pela “Alpha Filmes”, e com toda a introdução de aproximadamente 8 minutos cortada, além da disponibilidade apenas de versão dublada.

“Canibais” (Undead, 2003) # 290 – data: 28/12/04 – avaliação: 8 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 31/01/06)

“Canibais” (Undead, Austrália, 2003). Duração: 108 minutos. Direção, roteiro, produção, edição e efeitos visuais de Michael e Peter Spierig (“The Spierig Brothers”). Fotografia de Andrew Strahorn. Música de Cliff Bradley. Direção de Arte de Jane Culverhouse. Desenho de Produção de Matthew Putland. Maquiagem de Steven Boyle. Elenco: Felicity Mason (Rene Chaplin), Mungo McKay (Marion), Rob Jenkins (Wayne Wipple), Lisa Cunningham (Sallyanne), Dirk Hunter (Sargento Harrison), Emma Randall (Policial Molly), Steve Grieg, Noel Sheridan, Gaynor Wensley, Eleanor Stillman, Robyn Moore, Robert Jozinovic, Peter Mensforth, Jacob Andriolo, Michele Steel, William John King, Tim Dickenson, Brad Sheriff, Georgia Potter-Cowie, Francesca Arakelian.

Anjo da Morte (2002)


Para quem está à procura de um thriller policial com produção totalmente européia, e não for muito exigente, é só ir até sua locadora de vídeo e pedir “Anjo da Morte” (Angel of Death, 2002), lançado em DVD e VHS pela “FlashStar” em Agosto de 2005. O filme tem direção de Pepe Danquart e um elenco liderado pela dupla Mira Sorvino (de “Mutação”) e Olivier Martinez (de “Roubando Vidas”), numa co-produção entre seis países da Europa: Alemanha, Inglaterra, França, Itália, Espanha e Dinamarca.

O roteiro de Roy Mitchell, baseado em livro de David Hewson, não foge muito do convencional, mostrando basicamente as ações de um assassino, envoltas numa atmosfera de mistério e religião, e um grupo de detetives em seu encalço, na condução das investigações. A policial Maria Delgado (a bela Mira Sorvino), que tem descendência americana por parte da mãe, decide sair de Madrid, a capital espanhola, para trabalhar na cidade de Sevilha, depois de que seu marido juiz foi assassinado. Lá chegando em plena Semana Santa, ela é recepcionada pelo chefe de polícia Capitão Rodriguez (Fermí Reixach), que escolhe uma dupla de detetives locais, Quemada (Olivier Martinez) e Torillo (Féodor Atkine), para trabalhar com ela na investigação do assassinato brutal de dois irmãos gêmeos, onde era conhecido o fato de que o responsável vestia uma roupa e capuz vermelhos que cobriam todo o corpo, um tipo de vestimenta utilizado pelos penitentes, os seguidores da “Irmandade de Cristo”, uma conservadora seita religiosa católica.
Durante o trabalho de investigação, surge uma importante pessoa na trama, cujas informações e revelações podem levar à identidade do assassino. Ela é uma senhora idosa, Dona Catalina Lucena (a veterana e experiente atriz Alida Valli), a última descendente de uma família tradicional que foi perseguida e dizimada na guerra civil pelo regime fascista, sob o comando do perverso tirano e líder revolucionário Antonio Alvarez (Luis López Tosar).
Inicialmente, a detetive Delgado precisa enfrentar, além das ações do assassino e de uma tragédia familiar, também uma receptividade ruim por parte do colega da polícia espanhola Quemada, que estava mal humorado por ter sido abandonado pela mulher pouco tempo antes. Mas com o passar do tempo e a descoberta de importantes pistas para a solução do caso, eles terão que unir esforços para combater o inimigo.

“Anjo da Morte” é um filme bem trivial, com uma hora e meia de duração, e apresentando todos os elementos sempre presentes nas histórias de detetive. Tem um assassino inicialmente misterioso e que em breve o espectador já descobre sua identidade e motivações. Tem os investigadores trabalhando em sua captura, e nesse caso a tradicional dupla de detetives ainda recebe a ajuda não solicitada de uma bela mulher. Tem as correrias, perseguições e tiroteios de praxe, e as informações vão surgindo aos poucos, com revelações crescentes para o esclarecimento do mistério. Ou seja, um filme bem comportado de investigação policial, que não incita o espectador a pensar demais e tentar participar da trama. Vale apenas por curiosidade e por uma diversão rápida e sem compromisso. Como detalhes que merecem um registro, temos uma cena divertida envolvendo um turista americano arrogante (Tobias Oertel), que após ser atacado pelo criminoso encapuzado e sobrevivido ferido, insulta a polícia local mencionando a conhecida e histórica “inquisição espanhola”, e leva uma porrada na cabeça merecida para manter-se calado. E também a presença do médico legista Dr. Hidalgo (Carlos Castanon) nas cenas dos crimes, para sempre informar com acurada precisão e um profissionalismo mórbido a hora da morte das vítimas.

“Anjo da Morte” (Angel of Death (EUA) / Semana Santa (França), Alemanha / Inglaterra / França / Espanha / Itália / Dinamarca, 2002) # 368 – data: 30/01/06 – avaliação: 5,5 (de 0 a 10) – site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 30/01/06)

Locusts - O Dia da Destruição (2005)


Um dos vários subgêneros do cinema de horror e ficção científica que sempre é explorado de uma forma muito intensa é aquele que aborda a temática das catástrofes causadas por invasões de insetos. É muito fácil lembrarmos de vários filmes com a humanidade sendo ameaçada por ataques de abelhas, aranhas, lesmas, formigas, baratas, gafanhotos, sem contar a revolta de outros animais como ratos, sapos e pássaros, apenas para citar alguns exemplos. A “FlashStar” lançou no mercado brasileiro de DVD no final de 2005 mais um filme situado dentro desse contexto, “Locusts – O Dia da Destruição” (Locusts – Day of Destruction), produção americana de 2005, especialmente para a televisão, dirigida por David Jackson e estrelada por Lucy Lawless (de “O Pesadelo”). E nesse caso, o roteirista Doug Prochilo optou por escolher gafanhotos modificados geneticamente como os insetos protagonistas da destruição (como sugere o subtítulo).

A cientista chefe da divisão de insetos do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, Maddy Rierdon (Lucy Lawless), que também é uma agente federal, descobre que o entomologista Dr. Peter Axelrod (John Heard) está trabalhando sem autorização numa experiência genética com cruzamento de gafanhotos de espécies diferentes, e que havia criado um inseto híbrido resistente a todos os pesticidas conhecidos, além de ser mais forte, rápido, melhor reprodutor e viver mais que os gafanhotos normais. Rierdon desconfia que a experiência é um tipo de arma biológica financiada pelo Departamento de Defesa e ordena a incineração imediata dos insetos e a demissão do cientista responsável.
Porém, alguns gafanhotos conseguem escapar do laboratório para o meio ambiente e se espalham rapidamente por vários estados, reproduzindo-se numa escala descomunal formando imensos enxames que passam a destruir as plantações e até passando a usar a carne como fonte de alimento, ameaçando animais e seres humanos nos campos e cidades.
Para tentar combatê-los, Rierdon se une ao seu marido Dan Dryer (Dylan Neal), que trabalha no Departamento de Agricultura das “Nações Unidas”, e com quem estava tendo uma crise conjugal por causa do excesso de trabalho prejudicando a vida familiar, além também de unir os esforços e conhecimentos do Dr. Axelrod, agora arrependido por criar o gafanhoto híbrido que poderia causa uma tragédia de grandes proporções. Juntos, eles procuram desesperadamente uma solução para exterminar os insetos destruidores e evitar que o exército, sob o comando do General Miller (Greg Allan Williams), intervenha no caso utilizando um gás secreto altamente venenoso, desenvolvido como arma química e que poderia matar também muitas pessoas inocentes.

Primeiramente, não sei porque a distribuidora “FlashStar” optou por um título nacional misto, utilizando o original “Locusts” e traduzindo o subtítulo para nosso idioma. O melhor e mais coerente seria trocar o “Locusts” por “Gafanhotos”. Mas, independente disso, e falando especificamente do filme, podemos dizer que é apenas mais um exemplar do gênero, sem grandes atrações ou diferenciais, insistindo nos mesmos clichês e idéias repetitivas de sempre, com todos os eventos acontecendo com muita previsibilidade, justificando em parte ser uma produção para a televisão, pois a história é óbvia demais e sem ousadia. Não tem cenas de violência e mortes, os ataques dos gafanhotos são simples e inexpressivos, e as soluções para exterminar sua ameaça são artificiais e inverossímeis.
É um filme americano ao extremo, daqueles que eles gostam de fazer para eles mesmos apreciarem, deixando claro que o mundo termina em suas fronteiras. A “salvadora da pátria”, aquela que colocou em prática a solução para o problema da invasão dos gafanhotos famintos, ficou a cargo de uma mulher que só aparece próximo do final (antes teve apenas uma breve cena onde o diretor fez questão de mostrar o quanto ela é atrapalhada e “nerd” ao deixar cair um objeto durante uma importante reunião). Ela é a cientista Lorelei Wentworth (Natalia Nogulich), do Departamento de Energia. E também não faltou aquela frase já irritante de tão explorada, “diga para minha esposa e filha que eu as amo”, quando alguém está à beira da morte.
O roteiro é forçado para que todos os eventos do filme possam interagir de forma a obter aquele tradicional desfecho feliz de sempre. Da minha parte, ainda continuo torcendo para que algum dia os insetos possam triunfar sobre a raça humana (que nesse caso manipulou a natureza na criação de um gafanhoto híbrido), e aguardo um diretor e roteirista ousado o suficiente para contar uma história mais próxima de uma realidade, fugindo um pouco desse convencional mundo de fantasia do cinema.

“Locusts – O Dia da Destruição” (Locusts – Day of Destruction, Estados Unidos, 2005) # 367 – data: 30/01/06 – avaliação: 4 (de 0 a 10) – site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 30/01/06)

Blade: Trinity (2004)


Existem duas tendências bem definidas que estão presentes no cinema atual, a adaptação de personagens dos quadrinhos paras as telonas e a criação de franquias cada vez maiores e mais complexas. Ambas as tendências encontramos em “Blade: Trinity”, que estreou por aqui no primeiro dia do ano de 2005, sendo também o início da temporada dos filmes de horror a entrarem no circuito dos cinemas brasileiros. Blade é um anti-herói da editora americana “Marvel”, um caçador de vampiros que tem poderes e habilidades especiais com o objetivo de impedir o domínio dos sugadores de sangue na humanidade. “Blade: Trinity” é o terceiro filme de uma série que teve um original lançado em 1998 e uma sequência produzida quatro anos depois. Entre as características presentes durante toda a franquia, podemos destacar a presença do ator negro Wesley Snipes como o caçador de vampiros do título e a quantidade significativa de violência, ação e efeitos especiais.

A história dessa terceira aventura da série mostra uma conspiração dos vampiros para colocarem a polícia e a humanidade contra seu inimigo Blade, ao armarem uma emboscada que denunciou sua existência e atribuindo a ele uma conotação de vilão, um assassino louco que deve ser capturado. Blade tem que então enfrentar o FBI em seu encalço, principalmente o Chefe Martin Vreede (Mark Berry) e o psiquiatra Dr. Edgar Vance (John Michael Higgins), além de combater humanos traidores que colaboram com os vampiros e as próprias criaturas da noite lideradas dessa vez pelo temível Drácula (conhecido agora como Drake, interpretado por Dominic Purcell), um ser ancestral despertado de seu sono profundo pela vampira Danica Talos (Parker Posey), auxiliada pelo irmão Asher (Callum Keith Rennie) e o gigantesco Jarko Grimwood (o lutador “Triplo H”, ou Paul Michael Levesque), entre outros.
Porém, Blade recebe a ajuda de um grupo de humanos caçadores de vampiros que ele nem sabia que existia, chamado de “Nightstalkers” (traduzido por aqui como “Notívagos”), mais especificamente a bela Abigail Whistler (Jessica Biel), filha de seu veterano amigo e inventor de armas especiais Abraham (Kris Kristofferson, que também participou de todos os filmes), além do intrépido Hannibal King (Ryan Reynolds), que foi o escolhido pelo roteiro para ser o humorista de plantão, fazendo piadas a toda hora, nas situações mais tensas e perigosas, e na maioria das vezes não funcionando (confesso que torci muito em vão para algum vampiro silenciá-lo definitivamente). O grupo ainda tem a participação de outras pessoas na retaguarda e planejamento estratégico como a brilhante cientista cega Sommerfield (Natasha Lyonne). Juntos, eles somam seus esforços para combater os vampiros.

“Blade: Trinity” é exagerado em violência gratuita numa história sem maiores interesses, assim como os outros dois filmes anteriores da franquia. Pelo fato de eu não ser um fã de super heróis dos quadrinhos (nesse tipo de mídia eu prefiro mais os quadrinhos com aquelas histórias tradicionais de horror), não apreciei o filme o quanto poderia, tornando-se apenas mais uma pequena diversão rápida e passageira que poderia ser conferida tranquilamente no lançamento em DVD, não justificando um investimento maior com um ingresso de cinema. Como também não sou grande apreciador de filmes com excesso de ação e porradas para todos os lados, em detrimento de uma história mais desenvolvida e menos barulhenta, foi difícil entrar no clima do filme.
Acredito que é bem mais fácil produzir um filme essencialmente de ação que eventualmente tenha elementos de horror (na figura dos vampiros e a violência dos confrontos), como é o caso desse “Blade: Trinity”, amparado por um bom orçamento e modernos efeitos especiais, do que o desafio de fazer um filme de horror genuíno que apresente uma história estimulante que prenda a atenção do espectador e consiga estabelecer uma interação com o público.
Mas, independente de tudo isso, e analisando apenas como mais um filme que se situa dentro do gênero fantástico, existem momentos que poderão agradar a quem procura muita ação, barulho, correrias, perseguições, tiroteios, pancadarias e aquelas inevitáveis cenas forçadas de habilidades que são reservadas apenas para os “heróis”, e não para aqueles simples humanos normais como nós. “Blade: Trinity” tem atuações intensas de todo o elenco, com lutas bem coreografadas e um tratamento visual que impressiona, mas que são qualidades insuficientes para que o filme se destaque e deixe de ser apenas comum.

As filmagens de “Blade: Trinity” ocorreram na cidade de Vancouver, no Canadá, com a estréia nos cinemas dos Estados Unidos em 10/12/04, menos de um mês antes da chegada do filme ao Brasil, distribuído pela “PlayArte” a partir de 01/01/05.
Inicialmente, estava previsto a contratação do cineasta alemão Oliver Hirschbiegel, do excelente thriller “A Experiência” (The Experiment, 2001, lançado em DVD no Brasil pela “Europa”), para assumir a direção, mas como ele estava envolvido em outro trabalho, acabou declinando a oferta da “New Line”. O diretor de segundo filme da série, Guillermo Del Toro, também havia sido sondado mas preferiu concentrar sua atenção no projeto de adaptar para o cinema um outro personagem dos quadrinhos, “Hellboy”, num filme estrelado por Ron Perlman e que foi lançado nos cinemas brasileiros em 30/07/04. Então, com a desistência deles, a direção de “Blade: Trinity” acabou ficando mesmo para o roteirista dos três filmes da série, David S. Goyer.
Aliás, um tratamento inicial do roteiro previa uma história ambientada muitos anos à frente dos eventos do segundo filme, onde uma violenta guerra entre humanos e vampiros culminou com o domínio do planeta por esses últimos, com os humanos escravizados e tendo na figura de Blade a única esperança da humanidade. Mas a idéia teve que ser abandonada por causa de um outro filme com tema similar, uma refilmagem de “I Am Legend”, livro escrito por Richard Matheson e já filmado duas vezes antes nas décadas de 60 e 70, em versões estraladas por Vincent Price e Charlton Heston, respectivamente. E foi então escolhida a versão final da história com Blade sendo denunciado pelos vampiros como um inimigo da humanidade, despertando a atenção do FBI em sua captura, acrescentando mais caçadores de vampiros, os quais fazem parte de um grupo de elite chamado de “Nightstalkers”, e tendo como vilão maior um vampiro ancestral e poderoso conhecido como Drake, e despertado para combater Blade.
Outra curiosidade do roteiro é que havia a previsão da criação de uma personagem feminina da família do lendário caçador de vampiros Van Helsing, para fazer parte dos “Nightstalkers”, porém com a produção do filme “Van Helsing”, o personagem acabou sendo substituído por Hannibal King.
Como uma tendência já notada no cinema de horror dos últimos tempos, principalmente depois do surgimento do DVD como uma mídia que permite a apresentação de materiais extras, foram filmados vários finais alternativos e também houve a atenção do roteiro em propiciar um gancho para uma provável continuação da franquia, num desfecho oficial previsível que poderia até explorar um desenvolvimento maior dos personagens do grupo “Nightstalkers”.
Os cachorros vampiros que aparecem nesse terceiro filme da franquia possuem uma boca enorme com dentes afiados e tentáculos para destroçar suas vítimas, numa característica exatamente igual aos vampiros mutantes conhecidos como “reapers”, que apareceram no segundo filme. E é interessante notar como os cães tem recebido uma atenção especial pelo cinema como criaturas monstruosas e ameaçadoras, como por exemplo os cachorros zumbis da série “Resident Evil”. Apesar que os cachorros de “Blade: Trinity” tiveram uma participação muito rápida e pouco ameaçadora, quando poderiam ser melhor aproveitados.
Outras duas pequenas curiosidades no filme é o fato de uma garota atendente de uma loja de artefatos góticos, estar vestindo uma camisa da histórica banda de Heavy Metal “Motorhead”, momentos antes de fornecer à força sua jugular para alimentar um vampiro sedento por seu sangue. E numa cena onde Hannibal King está deitado numa cama se recuperando de um ferimento num violento confronto com vampiros, a televisão está exibindo um filme com o ator William Shatner, o eterno Capitão Kirk da série de TV “Jornada nas Estrelas”.
A bela atriz Jessica Biel, que esteve no elenco da refilmagem de “O Massacre da Serra Elétrica” (2003) e que interpretou em “Blade: Trinity” o papel de uma jovem caçadora de vampiros que maneja muito bem o arco e flecha como arma de ataque, foi a protagonista de uma cena que causou grande prejuízo aos produtores quando atirou uma flecha contra uma câmara que estava a sua frente. Toda a sequência foi registrada e ficará arquivada como erro de filmagens.
Paul Michael Levesque é um lutador profissional de luta livre nos Estados Unidos, conhecido pelo apelido de “Triplo H”, e que assim como seu companheiro de ringue Dwayne Johnson (chamado de “A Rocha” e que protagonizou o filme solo de “Escorpião Rei”, um personagem secundário da série “A Múmia”), foi convidado para fazer participações no cinema. Seu papel em “Blade: Trinity” é o de um enorme vampiro e sua performance como ator foi tão satisfatória para os produtores que sua participação foi estendida no filme. Aliás, o roteiro deu uma oportunidade para ele demonstrar algumas de suas habilidades como lutador, numa longa cena de briga com Hannibal King.

“Blade: Trinity” (Blade: Trinity, 2004) # 293 – data: 02/01/05 – avaliação: 5 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 30/01/06)

“Blade: Trinity” (Blade: Trinity, Estados Unidos, 2004). New Line / Warner Bros. Duração: 106 minutos. Direção de David S. Goyer. Roteiro de David S. Goyer, baseado em personagens criados por Mary Wolfman e Gene Colan. Produção de Wesley Snipes, David S. Goyer, Lynn Harris, Kevin Feige e Peter Frankfurt. Produção Executiva de Avi Arad. Fotografia de Gabriel Beristain. Música de Ramin Djawadi. Edição de Conrad Smart e Howard E. Smith. Direção de Arte de Patrick Banister e Eric Fraser. Desenho de Produção de Chris Gorak. Elenco: Wesley Snipes (Blade), Kris Kristofferson (Abraham Whistler), Dominic Purcell (Drake), Jessica Biel (Abigail Whistler), Ryan Reynolds (Hannibal King), Parker Posey (Danica Talos), Mark Berry (Chefe Martin Vreede), John Michael Higgins (Dr. Edgar Vance), Callum Keith Rennie (Asher Talos), Paul Michael Levesque (Jarko Grimwood), Paul Anthony (Wolfe), Françoise Yip (Virago), Michael Rawlins (Wilson Hale), Natasha Lyonne (Sommerfield).

A Batalha de Riddick (The Chronicles of Riddick, EUA, 2004)


Num determinado momento, um personagem diz para outro algo como: “Se você fosse o dono desse planeta e também do inferno, iria alugar o primeiro e ir viver no inferno”. A frase tem um efeito interessante pois o tal planeta, chamado de “Crematória”, possui uma variação de temperatura entre 370 graus Célsius positivos e 180 graus negativos. Mas, poderíamos utilizar o comentário de outra forma: “Se você assistiu Eclipse Mortal e ainda não viu A Batalha de Riddick, então fique com o primeiro e mande o outro para o inferno”.
Na verdade, deixando a brincadeira de lado e sendo menos radical, você pode assistir “A Batalha de Riddick” (The Chronicles of Riddick, 2004), que estreou nos cinemas brasileiros em 16/07/04, só não espere um filme no mesmo nível de seu antecessor, infinitamente superior, “Eclipse Mortal” (Pitch Black, 2000).

A história de “A Batalha de Riddick” se passa cinco anos após os eventos ocorridos no primeiro filme, onde um grupo de sobreviventes da queda de uma nave num planeta hostil tenta lutar por suas vidas contra monstros carnívoros alados noturnos, oriundos das profundezas do planeta e que vem à superfície somente há cada 22 anos. Para ajudá-los, eles tem que contar com a habilidade de um temido criminoso que tem o poder de enxergar no escuro, o anti-herói Richard Riddick.
Agora, Riddick (Vin Diesel, de “Velozes e Furiosos” e “Triplo X”) é um fugitivo que vive se escondendo de mercenários, liderados por Toombs (Nick Chinlund), que tentam capturá-lo em troca de recompensas. Seu destino acaba levando-o até o planeta “Helion Primeiro”, que está sendo invadido e dizimado por uma raça de seres sombrios conhecidos por “Necromongers”, um imenso exército de guerreiros conquistadores liderados pelo Lord Supremo (Colm Feore). Lá, ele descobre informações sobre sua origem através de Aereon (Judi Dench), um ser celestial na forma de uma sábia mulher da raça “Elemental”, e se vê obrigado a lutar contra os invasores para restabelecer o equilíbrio no Universo e salvar os vários mundos de serem subjugados pelo poder maléfico do “Subverso”, uma dimensão sombria que está assumindo o controle de tudo e de todos. Nesse empreitada, Riddick entrará em contato novamente com uma conhecida do passado, Kyra (Alexa Davalos), que está presa numa penitenciária subterrânea no planeta “Crematória”, e enfrentará um forte oponente no papel do comandante “necromonger” Vaako (Karl Urban, de “O Senhor dos Anéis: As Duas Torres” e “O Retorno do Rei”), que também tem a intenção de ocupar o lugar do Lord Supremo, numa intenção influenciada pela esposa (Thandie Newton, de “Missão Impossível”).

Desde que vi o trailer de “A Batalha de Riddick” pela primeira vez nos cinemas, já imaginava que esse novo filme da franquia iria apresentar uma história totalmente diferente e bem menos atraente do que “Eclipse Mortal”, investindo muito mais num show de belas imagens e efeitos especiais e muito menos num roteiro coerente e interessante. A história até parece não pertencer ao mesmo universo ficcional de seu antecessor, de tanto que os filmes são diferentes. Existem poucas coisas em comum como vagas lembranças de alguns eventos do original e a presença dos atores Vin Diesel e Keith David repetindo seus papéis, com o último sendo o religioso Imam e Diesel fazendo o temido assassino Riddick, que tem a particularidade de enxergar no escuro através de seus olhos especiais.
O argumento básico é muito superficial e de pouco interesse, deixando muitas pontas soltas e detalhes importantes sem explicações satisfatórias, como por exemplo a respeito do misterioso “Subverso”, não se aprofundando num melhor desenvolvimento da história, preferindo enfatizar as cenas de ação e os belos efeitos visuais em detrimento de um melhor roteiro. Algumas cenas são exageradas demais como o salvamento meio impossível de Kyra numa montanha em Crematória, onde Riddick utiliza uma corda num estilo “Tarzã”, aliás, um recurso também utilizado à exaustão em “Van Helsing”, tornando as cenas mais ridículas do que divertidas. Outra sequência forçada demais envolve Riddick e um animal selvagem similar a um tigre, na prisão em Crematória, que também não convence e poderia ficar tranquilamente ausente do filme.
Resumindo em poucas palavras, “A Batalha de Riddick” é um filme de Ficção Científica com elementos de Horror com um orçamento milionário (algo em torno de 120 milhões de dólares, com filmagens realizadas no Canadá) e um roteiro descartável, lembrando por exemplo o mesmo caso de “A Reconquista” (Battlefield Earth, 2000), um filme similar produzido com muito dinheiro e belíssimos cenários gigantescos, mas com uma história constrangedora de tão ruim e cheia de clichês irritantes. Talvez até funcionaria melhor se fosse desvinculado de seu filme anterior, o excelente “Eclipse Mortal”, mas os produtores justamente aproveitaram a oportunidade de seu sucesso comercial e investiram num filme destacando Riddick (que até está no título), numa jogada de marketing tentando faturar em cima da imagem de um personagem que nem é tão carismático assim para receber tanto destaque, provando que para se obter lucros no cinema também é necessário investir numa boa história.
Curiosamente, mesmo apesar do filme estar sendo mal recebido pela crítica e público em geral, a franquia está crescendo bastante, tanto que já existe uma animação chamada “Dark Fury”, baseada no mesmo universo ficcional, e há a intenção de se produzir pelo menos mais dois filmes dentro da mitologia iniciada com “Eclipse Mortal”, completando uma trilogia com essas novas aventuras de Riddick, num fato já provado pelo desfecho exagerado de “A Batalha de Riddick”, filmado especialmente como gancho para uma sequência, que talvez seria melhor se nem fosse filmada...

“A Batalha de Riddick” (The Chronicles of Riddick, 2004) # 267 – data: 19/07/04 – avaliação: 4 (de 0 a 10)
(postado em 30/01/06)

“A Batalha de Riddick” (The Chronicles of Riddick, Estados Unidos, 2004). Universal. Duração: 119 minutos. Direção de David Twohy. Roteiro de David Twohy, baseado em personagens criados por Jim Wheat e Ken Wheat. Produção de Vin Diesel e Scott Kroopf. Fotografia de Hugh Johnson. Música de Graeme Revell. Edição de Tracy Adams, Martin Hunter e Dennis Virkler. Desenho de Produção de Holger Gross. Direção de Arte de Kevin Ishioka, Mark W. Mansbridge e Sandi Tanaka. de Peter Knowlton. Elenco: Vin Diesel (Riddick), Colm Feore (Lorde Supremo), Thandie Newton (Dame Vaako), Judi Dench (Aereon), Karl Urban (Vaako), Alexa Davalos (Kyra), Nick Chinlund (Toombs), Keith David (Imam), Linus Roache, Mark Gordon, Roger R. Cross, Yorick van Wageningen. Site Oficial: www.thechroniclesofriddick.com

O Apanhador de Sonhos (2003)


Ao longo de sua extensa história de mais de 100 anos, o cinema sempre procurou adaptar obras literárias produzindo filmes com roteiros inspirados em livros de variadas temáticas e autores de diferentes estilos. Mais especificamente no caso do cinema de horror, os escritores mais famosos e com um maior número de histórias adaptadas são Edgar Allan Poe e Howard Phillips Lovecraft, representando uma época mais antiga, e Clive Barker e Stephen King, que fazem parte de um período mais recente e moderno do Horror. King, inclusive, é o recordista em filmes inspirados em sua obra, pois de forma direta ou indireta ele tem participado do cinema fantástico por quase 40 anos e 70 filmes (incluindo produções para televisão, vídeo, curta-metragens e mini-séries). Esses quatro autores, mundialmente famosos por suas consagradas carreiras literárias, são personalidades marcantes também no cinema, fornecendo idéias, argumentos e histórias para a criação de filmes de horror e ficção científica que tem proporcionado entretenimento para os apreciadores do estilo e povoado por décadas a imaginação dos fãs com os piores pesadelos...
A filmografia baseada em obras de Stephen King geralmente é considerada de qualidade duvidosa, com a produção de dezenas de filmes que dividem a opinião dos fãs toda vez que são lançados, impulsionando invariavelmente grande movimentação em polêmicas listas de discussão pela internet, com significativa quantidade de elogios e principalmente críticas. Todas essas opiniões a favor ou contrárias são sempre muito subjetivas considerando-se a diferença natural entre um livro e um filme e devido a todas as conhecidas dificuldades em se adaptar uma obra literária para a tela grande.
Mas o que mais tem incomodado os fãs da obra literária de Stephen King e os apreciadores do cinema de horror em geral é que em muitos dos filmes lançados trazendo o nome de King como inspiração de seus roteiros, na verdade houve uma atitude oportunista e equivocada de seus produtores em ganhar promoção utilizando o nome consagrado do autor, pois a maioria desses filmes trazem histórias superficiais e muito pouco baseadas realmente nos argumentos originais de Stephen King, impulsionando até uma quantidade enorme de sequências descartáveis a partir de filmes originais que já haviam sido mal adaptados.
Outro erro cometido várias vezes pelos produtores foi a insistência em se filmar um conto curto de Stephen King num filme de longa metragem em vez de um episódio de menor duração (apesar que esse fato também aconteceu em muitos casos), obrigando os roteiristas a criarem novas situações em torno do argumento original, distanciando-se de sua proposta inicial com resultados na maioria das vezes não satisfatórios.
Porém, o mais importante para quem aprecia o gênero horror, a despeito de todos os problemas e mesmo exercendo uma análise crítica necessária e indispensável, uma sugestão é procurar se envolver com o principal objetivo do cinema: DIVERSÃO.

Após estrear nos Estados Unidos em 21/03/03, pouco menos de um mês depois, em 18/04, entrou rapidamente em cartaz nos cinemas brasileiros mais um filme inspirado numa história do “Mestre do Horror Moderno” Stephen King. Trata-se de “O Apanhador de Sonhos” (Dreamcatcher), dirigido por Lawrence Kasdan e com os experientes Morgan Freeman e Tom Sizemore no elenco, numa mistura de horror com elementos de ficção científica. O roteiro foi escrito por William Goldman, que já havia adaptado anteriormente outros dois livros de King para o cinema, “Louca Obsessão” (Misery, 1990) e “Lembranças de um Verão” (Hearts in Atlantis, 2001), produzidos pela “Castle Rock Entertaiment”.

Na pequena cidade de Derry, no Estado americano de Maine (terra natal de King e cenário de muitas de suas histórias), um grupo de quatro jovens amigos, Henry (Mike Holekamp), Jonesy (Giacomo Baessato), Beaver (Reece Thompson) e Pete (Joel Palmer) salvam um garoto deficiente mental e com poderes especiais telepáticos chamado Duddits (Andrew Robb) que estava sendo molestado por uma gangue de adolescentes. A partir desse incidente, o grupo de garotos recebe de Duddits como presente de gratidão um dom sobrenatural de premonição e uma capacidade de se comunicar telepaticamente, criando um forte vínculo entre eles e reforçando ainda mais a amizade existente.
Vinte anos depois, o grupo volta a se reunir numa cabana isolada numa floresta envolvida por tempestade de neve. Já adultos, o psiquiatra Dr. Henry Devlin (Thomas Jane), o professor universitário Gary “Jonesy” Jones (Damian Lewis), o vendedor de carros Pete Moore (Timothy Olyphant) e o marceneiro Joe “Beaver” Clarendon (Jason Lee) encontram um homem perdido na floresta com uma estranha e misteriosa doença que deixa uma marca vermelha no rosto, e cujo corpo serviu de incubadora para uma criatura mortal (numa referência ao clássico “Alien, o Oitavo Passageiro”, 1979, de Ridley Scott, e também pelo nome “Ripley” batizado como a doença alienígena, homenageando a famosa heroína de mesmo nome interpretada por Sigourney Weaver).
A partir daí, eles se envolvem novamente com o agora adulto paranormal Duddits (Donnie Wahlberg), presenciam e combatem uma tentativa de invasão alienígena e enfrentam um grupo especial de militares, liderados pelo austero Coronel Abraham Curtis (Morgan Freeman) e o Capitão Owen Underhill (Tom Sizemore), que isolam a área decretando estado de quarentena, e que secretamente estão investigando as ações dos alienígenas hostis no planeta já há vinte e cinco longos anos.

“O Apanhador de Sonhos” é mais um filme comum que situa-se apenas na média das dezenas de produções inspiradas em obras de Stephen King. O roteiro é até interessante, numa mistura de horror, ficção científica (com influências notáveis de filmes similares como “Invasores de Corpos”/1978 e “O Enigma de Outro Mundo”/1982, que por sua vez já eram refilmagens dos clássicos “Vampiros de Almas”/1956 e “O Monstro do Ártico”/1951, respectivamente), e uma forte amizade entre um grupo de jovens (tema que já havia sido bem explorado no filme “Conta Comigo”, de 1986). Mas sua trama é convencional num imenso desfile de clichês e situações previsíveis já vistas inúmeras vezes. Algumas cenas e diálogos propositadamente cômicos (principalmente a cargo do personagem Pete) são totalmente desnecessários. Em filmes sérios de horror o ideal seria evitar as tentativas equivocadas de inserir elementos de humor, a não ser em casos explícitos de paródia ou homenagem a outros filmes, como por exemplo os excelentes e super divertidos “A Volta dos Mortos-Vivos” (The Return of the Living Dead, 1985) e “Malditas Aranhas!” (Eight Legged Freaks, 2001), pois dificilmente o “crossover” entre horror sério e humor traz um resultado satisfatório.
Os personagens dos militares interpretados por Morgan Freeman e Tom Sizemore são arquétipos banais que não convencem, e que já foram explorados à exaustão pelo cinema, desperdiçando os talentos de seus experientes atores. Não faltou também o tradicional clichê de rivalidade entre as diversas organizações secretas do exército, envolvendo nesse caso um conflito particular do Coronel Curtis (Freeman) com o General Matheson (Michael O’Neill).
O personagem de Duddits, mesmo sendo deficiente mental, protagoniza alguns momentos difíceis de assimilar em atitudes que beiram o ridículo, principalmente na sua fase adulta. E seria interessante também uma redução na duração dos longos 136 minutos para algo em torno de pouco menos de duas horas, pois o filme não tem uma dinâmica capaz de sustentar a longa metragem.
De positivo, destacam-se uma cena inicial com o violento atropelamento do personagem Jonesy (interessante notar que o próprio Stephen King sofreu uma tragédia similar em sua vida em junho de 1999, e “Dreamcatcher” foi o primeiro livro publicado que ele escreveu após esse grave atropelamento que quase o matou); a bela fotografia de um ambiente de claustrofobia numa cabana no meio de uma floresta coberta pela neve (lembrando situação parecida com o hotel assombrado e isolado de “O Iluminado”, 1980); a interessante forma como foi apresentada a memória no cérebro do personagem Jonesy, dividida por setores e depósitos de arquivos pessoais (ele que havia sido possuído por um dos alienígenas); os eficientes efeitos especiais dos extraterrestres (destacando as asquerosas “enguias” assassinas, com suas bocas repletas de dentes afiadíssimos); a ótima sequência de ataque dos helicópteros do exército ao local do acidente de uma imensa e belíssima nave alienígena encravada na floresta, com seus tripulantes à deriva e tentando confundir as mentes dos pilotos da frota de ataque com mensagens de socorro; e o inevitável confronto final entre Duddits e um líder alienígena num desfecho revelador.

O título nacional foi bem escolhido, limitando-se a apenas traduzir corretamente o original em inglês, “Dreamcatcher” (ou “O Apanhador de Sonhos”). Aliás, os responsáveis pela definição dos nomes dos filmes estrangeiros no Brasil deveriam simplificar sempre seu trabalho e procurar apenas traduzir literalmente para o nosso idioma os títulos originais, com raras exceções onde torna-se necessário uma adaptação do nome nacional por questões comerciais.
O diretor Lawrence Kasdan é conhecido principalmente como roteirista de filmes de grande sucesso de público como “Os Caçadores da Arca Perdida” (1981), de Steven Spielberg, e dois episódios da primeira trilogia filmada da franquia “Star Wars”, criada por George Lucas, “O Império Contra-Ataca” (1980) e “O Retorno de Jedi” (1983). Na direção, foi o responsável por dois excelentes “westerns” modernos, “Silverado” (1985) e “Wyatt Earp” (1994), ambos com Kevin Costner.
Como curiosidade, é interessante mencionar que “Dreamcatcher” é realmente uma lenda indígena americana sobre “um filtro dos sonhos”, um aro de ramos entrelaçados numa complexa teia de fonte de energia, por onde passam os sonhos bons que viajam pela noite fluindo tranquilamente até as pessoas que dormem, e por onde também são aprisionados os pesadelos até sucumbirem com o final da noite e a chegada das primeiras luzes do dia.
E outro fato curioso foi que Stephen King cobrou simbolicamente apenas US$ 1,00 pelos direitos de produção do filme, procurando não se envolver com o roteiro, devido às várias experiências anteriores com adaptações de suas histórias para as telas e as quais não foram bem sucedidas, não contribuindo satisfatoriamente para seu legado de sucesso na literatura, pois muitos dos filmes inspirados em sua obra foram mal recebidos por seus fãs.

Enfim, “O Apanhador de Sonhos” não é um filme empolgante e nem destaca-se na filmografia de Stephen King. Mas ainda assim garante alguns bons momentos de diversão, numa história de horror e invasão alienígena. E também desperta um interesse especial principalmente por ser baseado em história do mestre do horror moderno.
Porém, em minha opinião os melhores filmes inspirados na consagrada obra literária de King continuam sendo os primeiros filmados há mais de 20 anos atrás como “Carrie, a Estranha” (Carrie, 1976) e principalmente “O Iluminado” (The Shining, 1980, dirigido por Stanley Kubrick e que estranhamente Stephen King não gostou, gerando uma curiosa polêmica entre eles na época); ou ainda mais recentemente como “O Cemitério Maldito” (Pet Sematary, 1989) e “Louca Obsessão” (Misery, 1990).

“O Apanhador de Sonhos” (Dreamcatcher, 2003) – avaliação: 5 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 30/01/06)

O Apanhador de Sonhos (Dreamcatcher, Estados Unidos, 2003). Warner Bros. Duração: 136 minutos. Direção de Lawrence Kasdan. Roteiro de William Goldman e Lawrence Kasdan, baseado em obra homônima de Stephen King. Produção de Charles Okun, Jon Hutman, Stephen Dunn e Casey Grant. Produção Executiva de Bruce Berman. Fotografia de John Seale. Edição de Carol Littleton e Raul Davalos. Música de James Newton Howard. Maquiagem de William Corso. Efeitos Especiais de Les Bowie (“Industrial Light & Magic”). Elenco: Morgan Freeman (Coronel Abraham Curtis), Thomas Jane (Dr. Henry Devlin), Jason Lee (Joe “Beaver” Clarendon), Damian Lewis (Gary “Jonesy” Jones), Timothy Olyphant (Pete Moore), Tom Sizemore (Capitão Owen Underhill), Donnie Wahlberg (Douglas “Duddits” Cavell), Mike Holekamp (jovem Henry), Giacomo Baessato (jovem Jonesy), Reece Thompson (jovem Beaver), Joel Palmer (jovem Pete), Michael O’Neill (General Herman Matheson), Ingrid Kavelaars (Trish Oservich), Alex Campbell (Richie Grenadeau), Chera Bailey (Rachel Mendol), Shauna Kain (Josie Rinkenhauer), Campbell Lane (Gosselin), Ty Olsson (Sargento Andy Janas), Rosemary Dansmore (Roberta Cavell), Eric Keenleyside (Rick McCarthy).

Anaconda 2: A Caçada Pela Orquídea Sangrenta (2004)


Os caçadores irão se tornar os caçados

Em 1997 foi lançado um filme despretensioso e muito divertido de horror apresentando como destaque uma cobra gigantesca atacando uma expedição científica na selva amazônica e devorando seus integrantes. Com o nome de “Anaconda” e elenco liderado pelo experiente Jon Voight ao lado dos hoje conhecidos Owen Wilson, Ice Cube e Jennifer Lopez (todos em início de carreira e agora atores bastante requisitados), o filme é uma típica produção “B” que fez um grande sucesso nos cinemas. Essa boa receptividade do público motivou a produção de uma continuação sete anos depois, com efeitos especiais melhores, mais sofisticados e realistas, porém com atores desconhecidos e apenas comuns.
Anaconda 2: A Caçada Pela Orquídea Sangrenta” (Anacondas: The Hunt for the Blood Orchid) entrou em cartaz no Brasil em 17/09/04 e é claramente uma produção daquelas que são lançadas diretamente no mercado de vídeo, sendo que sua exibição nos cinemas é um fato curioso, pois o filme não possui um apelo comercial tão forte para justificar sua distribuição na tela grande. E depois de assisti-lo, a conclusão é que deveria realmente ser lançado apenas em vídeo, pois não possui um nível de qualidade que o indicasse para os cinemas (se bem que os executivos, que somente pensam nos lucros, costumam distribuir nas telonas cada tranqueira inacreditável, como por exemplo o completamente dispensável “Mulher-Gato”).

O roteiro até que possui um argumento básico interessante, onde uma expedição é formada rumo às selvas tropicais de Bornéo, na Indonésia, com o objetivo de encontrar e recolher espécimes de uma orquídea rara que floresce durante seis meses e somente a cada longos sete anos. A flor é conhecida como “orquídea sangrenta” (daí o subtítulo do filme), e possui uma composição que permitira uma revolução científica na área farmacêutica, com a produção de um soro que poderia teoricamente prolongar a vida, ou como diz um dos personagens, algo como a descoberta da “fonte da juventude”.
Pensando nos enormes lucros caso os testes com humanos dessem um resultado positivo, uma poderosa empresa farmacêutica de New York financia um grupo de especialistas para coletar a planta nas matas selvagens da ilha de Bornéo, porém um dos fatores contrários era o tempo, restando apenas duas semanas para o término do florescimento das orquídeas. A expedição é formada às pressas por seis jovens, o líder Dr. Jack Byron (Matthew Marsden), sua assistente Sam Rogers (KaDee Strickland), seu sócio Gordon Mitchell (Morris Chestnut), o especialista em computadores Cole Burris (Eugene Byrd), o médico Dr. Ben Douglas (Nicholas Gonzalez), e a cientista Gail Stern (Salli Richardson-Whitfield), representante da empresa financiadora do projeto. Juntam-se a eles ainda o dono de um barco que os levaria rio acima até o local das orquídeas, Bill Johnson (Johnny Messner), um ex-soldado do exército americano, e seu ajudante Tran (Karl Yune), natural da região e conhecedor das florestas e rios que compõe sua perigosa geografia. Eles eram os únicos disponíveis para a missão devido às péssimas condições climáticas com muitas chuvas, somente aceitando levar o grupo em troca de muito dinheiro para recompensar os riscos.
Porém, antes de completarem “a caçada pela orquídea sangrenta”, eles enfrentam uma série de obstáculos trágicos como o naufrágio do barco na queda de uma cachoeira, o ataque de aranhas venenosas e sanguessugas, e principalmente a fúria de um grupo de anacondas famintas por suas carnes e que estavam se reunindo para a época do acasalamento. Os tamanhos imensos dessas cobras aquáticas eram resultado dos crescimentos contínuos graças ao prolongamento de suas vidas ao ingerirem as orquídeas, e a partir daí invertem-se os papéis dos integrantes da expedição, passando de caçadores para caçados, conforme diz a tagline promocional reproduzida no início desse texto.

A única relação com o filme original de 1997 é a presença das cobras gigantes, mais ameaçadoras com a ajuda dos efeitos especiais, porém a maior decepção é justamente elas aparecerem muito pouco, quando poderiam ser melhor exploradas em cenas com mais tensão e elementos de horror. Além de aparecerem raramente, o roteiro centraliza as ações em torno do grupo que está à procura das orquídeas no meio da selva, sendo que esses personagens são tão irritantes, especialmente o medroso Cole (que grita histericamente o tempo todo), que acabamos torcendo para servirem de comida para as cobras o quanto antes. Todos eles são arquétipos mostrando jovens sem escrúpulos, gananciosos, egocêntricos e com uma ambição exagerada por dinheiro e sucesso em suas carreiras, com direito a cantadas ridículas nas moças e exemplos forçados de valentia e coragem (como a cena da luta do “herói” com um crocodilo enorme), além das várias tentativas de piadas desnecessárias e o desfecho previsível e óbvio demais.
Com as filmagens realizadas na Ilha de Fiji, os poucos destaques a serem registrados são uma cena envolvendo a queda do barco numa cachoeira, numa sequência muito bem filmada; a presença divertida de um pequeno macaco, que atua com expressões faciais às vezes até melhores que a dos próprios atores); e principalmente as poderosas anacondas devoradoras de homens, que são o ápice da produção nas poucas vezes quando entraram em ação. No mais, é apenas outro filme comum cujo divertimento logo se esquece.

“Anaconda 2: A Caçada Pela Orquídea Sangrenta” (Anacondas: The Hunt for the Blood Orchid, 2004) # 271 – data: 19/09/04 – avaliação: 5 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 27/01/06)

“Anaconda 2: A Caçada Pela Orquídea Sangrenta” (Anacondas: The Hunt for the Blood Orchid / Anaconda 2: The Black Orchid, Estados Unidos, 2004). Columbia / Screen Gems. Duração: 96 minutos. Direção de Dwight Little. Roteiro de John Claflin, Daniel Zelman, Michael Miner e Ed Neumeier, baseados em história de Hans Bauer, Jim Cash e Jack Epps Jr.. Produção de Verna Harrah. Produção Executiva de Jacob Rose. Fotografia de Stephen F. Windon. Música de Nerida Tyson-Chew. Edição de Marcus D´Arcy. Desenho de Produção de Bryce Perrin. Direção de Arte de Brian Edmonds. Elenco: Johnny Messner (Bill Johnson), KaDee Strickland (Samantha Rogers), Matthew Marsden (Dr. Jack Byron), Nicholas Gonzalez (Dr. Ben Douglas), Eugene Byrd (Cole Burris), Karl Yune (Tran), Salli Richardson-Whitfield (Gail Stern), Morris Chestnut (Gordon Mitchell).

A Experiência (Alemanha, 2001)


Sempre é recomendável quando possível conferir filmes que são produzidos fora dos Estados Unidos, um país conhecido por representar o cinema comercial mais badalado do mundo, para entre outras razões, entrar em contato com produtos de outras culturas, como por exemplo os filmes feitos na Alemanha. Um deles, em especial, produzido em 2001, vale a pena conhecer por apresentar um tema sempre fascinante através da crítica social à verdadeira essência do ser humano. “A Experiência” (“Das Experiment”, o título original alemão, ou “The Experiment” na distribuição internacional), é um thriller interessante com mais de duas horas de duração, evidenciando o intenso grau de irracionalidade do homem, característica de sua natureza agressiva, quando é colocado em condições sob forte pressão psicológica, num eterno conflito interno sobre os conceitos de dominação e dominado.

O filme foi lançado em DVD no Brasil pela “Europa Filmes” (www.europafilmes.com.br) e conta a história de um motorista de táxi, Tarek Fahd (Moritz Bleibtreu), que decide participar de uma experiência científica de simulação de uma prisão ao ler um anúncio de jornal sobre o recrutamento de voluntários, que seriam pagos para servirem de guardas ou prisioneiros por quatorze dias numa penitenciária construída num laboratório de pesquisas, sendo monitorados com o auxílio de câmeras por uma equipe de cientistas durante as vinte e quatro horas do dia.
O responsável pelo experimento é o Professor Dr. Klaus Thon (Edgar Selge), auxiliado pela Dra. Jutta Grimm (Andrea Sawatzki) e o assistente Lars (Philipp Hochmair). Após passarem por uma etapa de entrevistas, um grupo de vinte voluntários é selecionado para fazer parte da experiência, sendo divididos entre oito guardas e doze prisioneiros. A equipe de guardas é formada por Berus (Justus von Dohnanyi), Kamps (Nicki von Tempelhoff), Eckert (Timo Dierkes), Bosch (Antoine Monot Jr.), Renzel (Lars Gartner), Glaser (Jacek Klimontko), Stock (Markus Klauk) e Amandy (Ralph Puttmann), os quais tem como missão a manutenção da ordem na prisão e a disciplina entre os prisioneiros. Já a equipe de presos é representada por números sendo formada por Tarek (“77”), o piloto militar Steinhoff (Christian Berkel) como “38”, o dono de lanchonete Schutte (Oliver Stokowski) como “82”, Joe (Wotan Wilke Mohring) como “69”, além de outros prisioneiros como “53” (Stephan Szasz), “40” (Polat Dal), “21” (Danny Richter), “15” (Ralf Muller), “74” (Markus Rudolf), “11” (Peter Fieseler), “86” (Thorsten Dersch), e “94” (Sven Grefer), os quais são divididos em grupos de três em quatro celas.
Algumas regras deveriam ser respeitadas durante a experiência, como os guardas chamarem os presos apenas por seus respectivos números de uniforme e não utilizarem violência para manter a ordem, e os prisioneiros por sua vez deveriam se dirigir aos guardas sempre com respeito e submissão não falando seus nomes diretamente. E todos poderiam desistir do projeto a qualquer momento, caso não suportassem as severas condições do jogo (os prisioneiros teriam seus direitos civis cancelados enquanto estivessem atrás das grades, por exemplo). Mas quem desistisse não receberia o pagamento anunciado, a principal motivação para participarem da experiência.
Enquanto isso, o foco da história é direcionado para o personagem Tarek, que aproveita a oportunidade da prisão simulada utilizando um óculos especial que serve de câmera, para vender depois uma matéria escrita ilustrada com fotos de forma não autorizada para a imprensa, na figura do chefe de redação Ziegler (André Jung). Ele conhece também, momentos antes de ingressar na experiência, e através de um acidente de trânsito, uma bela jovem chamada Dora (Maren Eggert), por quem se apaixona e que tem um papel importante no caos em que se transformaria a experiência científica.
No primeiro dia da simulação, todos acabam se divertindo e fazendo brincadeiras, pensando que ganhariam um dinheiro fácil depois de duas semanas de confinamento. Porém, logo no dia seguinte o ambiente começa a apresentar uma série de turbulências cada vez mais crescentes quando os líderes naturais de ambos os grupos opostos passam a se enfrentar. Berus torna-se o líder dos guardas, agindo com métodos de humilhação e prepotência que lembra o nazismo, e “77” lidera os prisioneiros através de um motim sem sucesso.
Paralelamente, os cientistas coletavam dados e informações na observação das condutas e reações das “cobaias”, quando colocadas em confinamento e sob fortes pressões psicológicas. Porém, o que eles não imaginavam é que em apenas cinco dias, depois de dois prisioneiros no hospital e um em profundo estado depressivo, a experiência perde completamente o controle e transforma-se numa guerra violenta com direito a mortes e espancamentos, enfatizando a fragilidade das relações humanas em condições hostis, e evidenciando o alto grau de selvageria característica da natureza de nossa espécie, num conflito cada vez mais intenso entre guardas e prisioneiros, envolvendo até os funcionários dos bastidores da experiência, culminando num desfecho trágico de consequências imprevisíveis.

Primeiramente, devemos ter cuidado para não confundir esse “A Experiência” com o filme de Ficção Científica de mesmo nome nacional, lançado em 1995, e que tem a bela Natasha Henstridge no elenco e o nome original de “Species” (inclusive tendo uma continuação três anos depois). O filme alemão foi dirigido por Oliver Hirschbiegel e baseado na novela “Black Box”, de Mario Giordano, que também colaborou com o roteiro juntamente com Don Bohlinger e Christoph Darnstadt. E a história foi inspirada numa experiência similar real conduzida em 1971 e conhecida como “Stanford Prison Experiment”.
A tagline promocional que está reproduzida na capa do DVD resume em poucas palavras um fato verdadeiro já comprovado numa infinidade de exemplos vindos da vida real da raça humana. “Homem: naturalmente agressivo. Cientificamente provocado.” Não precisamos nem citar as infindáveis guerras e conflitos armados que desfilaram e ainda permanecem em toda a história da humanidade, para exemplificar a natureza violenta do homem. Basta colocar algumas pessoas comuns num ambiente de confinamento, em condições desfavoráveis, que os conflitos de interesses, a arrogância e o instinto de poder e supremacia de uns sobre ou outros, sentimentos primitivos de uma espécie supostamente racional, para presenciarmos atos de selvageria típicos da humanidade. E esse tema é muito bem explorado num suspense perturbador crescente de tensão, e que ganha proporções imensas quando percebemos que os eventos da história refletem uma dura realidade do nosso mundo.
Como filme, “A Experiência” funciona muito bem mantendo o interesse por toda a longa projeção, convidando-nos a participar também daquele experimento científico, criando uma empatia com os personagens principais, o prisioneiro “77” e o guarda Berus, e nos colocando no meio de um caos perturbador. O único detalhe que pareceu uma falha no roteiro foi a incrível fragilidade da equipe científica que controlava a experiência, demonstrando pouca segurança na estrutura de um projeto com tamanha magnitude, passando uma idéia inverossímil nos bastidores. Mas nada que prejudique significativamente o filme, que merece o reconhecimento que tem atingido em vários festivais internacionais de cinema na Alemanha, Canadá e Estados Unidos, com muitos prêmios já conquistados.

“A Experiência” (Das Experiment, 2001) # 263 – data: 03/07/04 – avaliação: 8 (de 0 a 10)
site: www.bocadoinferno.com / blog: www.juvenatrix.blogspot.com (postado em 27/01/06)

“A Experiência” (Das Experiment / The Experiment, Alemanha, 2001). Duração: 124 minutos. Direção de Oliver Hirschbiegel. Roteiro de Don Bohlinger, Christoph Darnstadt e Mario Giordano, baseado no livro “Black Box”, de Mario Giordano. Produção de Marc Conrad, Norbert Preuss, Friedrich Wildfeuer e Benjamin Herrmann. Produção Executiva de Philip Evenkamp. Fotografia de Rainer Klausmann. Música de Alexander Bubenheim. Edição de Hans Funck. Desenho de Produção de Andrea Kessler. Elenco: Moritz Bleibtreu (Tarek Fahd), Christian Berkel (Steinhoff), Oliver Stokowski (Schutte), Wotan Wilke (Joe), Justus von Dohnanyi (Berus), Nicki von Tempelhoff (Kamps), Timo Dierkes (Eckert), Antoine Monot Jr. (Bosch), Edgar Selge (Prof. Dr. Klaus Thon), Andrea Sawatzki (Dra. Jutta Grimm), Philipp Hochmair (Lars), Maren Eggert (Dora), André Jung (Ziegler).

Tropas Estelares (Starship Troopers, EUA, 1997)




“No futuro ainda existirão guerras em nome da honra, da glória e da sobrevivência. Só o inimigo mudará.”

O diretor holandês Paul Verhoeven, conhecido por ótimos trabalhos no cinema fantástico como “Robocop, o Policial do Futuro”, com Peter Weller, “O Vingador do Futuro”, com Arnold Schwarzenegger, e “O Homem Sem Sombra”, com Kevin Bacon, também é o cineasta responsável por um dos mais divertidos filmes de Ficção Científica com elementos de Horror desde o clássico “Alien, o Oitavo Passageiro” (1979), de Ridley Scott. 
Trata-se de “Tropas Estelares” (Starship Troopers, 1997), baseado em livro homônimo de Robert A. Heinlein escrito em 1959, e que pode ser considerado um dos ápices da filmografia de FC com o Horror em seu estado mais puro, associado à violência insana da guerra. Pois não faltam cenas impressionantes de batalhas entre homens e insetos alienígenas, com direito a um enorme volume de sangue jorrado em profusão, com uma infinidade de corpos mutilados, desmembrados, dilacerados e destroçados de uma forma extremamente selvagem, evidenciando a fragilidade dos corpos dos seres humanos, entre carne, sangue, músculos e ossos.    

A história é ambientada num futuro onde a humanidade está em guerra com uma raça alienígena de insetos e as pessoas são classificadas entre civis e cidadãos, não existindo mais a democracia que fracassou através dos cientistas sociais que levaram o caos ao planeta, passando o comando aos militares, chamados de veteranos. Os cidadãos são aqueles que se alistam no exército aceitando a responsabilidade pelo corpo político e defendendo-o com suas próprias vidas. Na televisão são exibidas aquelas mensagens de convocação da população para o alistamento militar, verdadeiros comerciais para o recrutamento de soldados, tipicamente inspirados nas propagandas políticas fascistas, explicando ao civil porque ele deve se unir às Tropas da Federação. A televisão também é um meio de propagação da violência, onde execuções de criminosos na cadeira elétrica são transmitidas ao vivo. 
Enquanto isso, os insetos alienígenas são uma espécie de aracnídeos que evoluíram em milhões de anos chegando a colonizar planetas, com a vantagem de não demonstrarem medo, enfrentando a morte com frieza, e sendo liderados por um cérebro inteligente. Eles possuem uma estrutura hierárquica militar similar aos exércitos humanos e são muito mais fortes fisicamente e extremamente violentos, não fazendo prisioneiros e sendo abatidos apenas quando seus sistemas nervosos são atingidos. Os insetos são oriundos de outra galáxia, do planeta Klendathu, que orbita um sistema estelar duplo cujas forças gravitacionais produzem uma infinidade de meteoros na forma de um cinturão de asteroides. Eles utilizam esses meteoros para atacar a Terra, causando uma guerra definitiva entre as espécies para a sobrevivência apenas de uma das raças.
Dentro desse contexto conturbado, a ação volta-se para o chamado “paraíso latino”, numa escola em Buenos Aires onde estudam o jovem filho de uma família rica, Johnny Rico (Casper Van Dien), sua namorada filha de um militar, a bela Carmen Ibanez (Denise Richards), que pretende ser piloto da frota, e dois amigos em comum do casal, o sensitivo e inteligente Carl Jenkins (Neil Patrick Harris), e a bela Dizzy Flores (Dina Meyer), apaixonada por Johnny e que pretende se alistar na infantaria. Para impressionar a namorada, e contra a vontade de seus pais, Johnny se alista na Infantaria junto com Dizzy, enquanto Carl é recrutado para servir na Inteligência Militar e Carmen vai para a Aeronáutica seguir carreira.   
Os treinamentos têm início. Enquanto Johnny e Dizzy conhecem na Infantaria outros soldados como Ace Levy (Jake Busey), sendo coordenados pelo severo Sargento Zim (Clancy Brown), Carmen encontra na frota um antigo colega de escola e agora instrutor, Zander Barcalow (Patrick Muldoon), além de conhecer a Capitã Deladier (Brenda Strong), onde juntos fazem parte da tripulação da enorme nave estelar “Rodger Young”.
Durante o período de treinamentos, um ataque catastrófico dos insetos alienígenas ao enviarem um asteroide para aniquilar Buenos Aires, é o impulso definitivo para decretar a guerra. Um planejamento estratégico organizado pelo governo militar é então preparado e os humanos realizam uma forte investida contra o planeta dos insetos. Porém, uma vez subestimando a capacidade de defesa dos inimigos aracnídeos, os pelotões de infantaria são terrivelmente massacrados com mais de 300.000 soldados mortos em poucas horas de combate, além de outras perdas significativas da frota com ataques de plasma enviados da superfície do planeta pelos insetos tanque.
Após reorganizar seus exércitos com uma nova estratégia de combate, a humanidade parte para uma nova ofensiva contra os insetos, na tentativa de capturar o líder e cérebro dos inimigos. Através de um bombardeio aéreo seguido de um ataque por terra com a infantaria, liderada pelo Tenente Jean Rasczak (Michael Ironside), numa série de confrontos determinantes para a sobrevivência de apenas uma espécie.

“Pensar por si próprio é a única liberdade que temos.” – Jean Rasczak, professor e Tenente da infantaria 

“Tropas Estelares” apresenta a união de uma temática de ficção científica com fortes elementos de horror e guerra, num conjunto determinante para uma história bastante intensa de ação e violência de um campo de batalha. Com a vantagem dos eventos ocorrerem num universo fictício num confronto dos humanos contra insetos alienígenas, não deixando de lado uma oportuna crítica à “irracionalidade” conhecida da humanidade em idolatrar as armas e a guerra, preferindo resolver seus conflitos sempre com a violência e enaltecendo os vários modelos políticos militares baseados em repressão.
Olhando apenas pelo lado da diversão, objetivo maior do cinema, “Tropas Estelares” garante duas horas do mais puro entretenimento, principalmente pelas cenas de batalha e os corpos dos soldados sendo destroçados pelos insetos. O filme pode ser dividido em duas partes, sendo a primeira bem inferior, voltada para a apresentação dos personagens, na maioria formados por jovens preocupados também com amores adolescentes. Aqui temos os pontos negativos do filme, com o roteiro abusando do uso daqueles clichês descartáveis, enfatizando demais os relacionamentos amorosos de um grupo de jovens divididos entre a escola e o alistamento militar. Nessa primeira metade do filme ocorre também a introdução de alguns elementos importantes da história como a existência dos insetos alienígenas ameaçadores para a sobrevivência da Terra e a consequente guerra com a humanidade. A segunda parte, a partir da metade, é bem melhor ao evidenciar a brutalidade insana da guerra, com as realistas cenas de batalhas aéreas e na superfície, com os brutais massacres tanto de insetos (espalhando seu sangue verde) quanto principalmente de homens (manchando a tela de vermelho), tendo suas carnes frágeis sendo rasgadas por enormes garras afiadas. Nesse momento, “Tropas Estelares” atinge um ritmo frenético de violência digno de se manter na eterna lembrança dos apreciadores do cinema fantástico. 
Duas cenas em especial merecem registro pela intensidade de ação e impecável produção. A primeira é quando o soldado Johnny Rico consegue a proeza de explodir um enorme inseto tanque, ao conseguir depositar em seu interior uma bomba. A outra cena é a eletrizante e incrível carnificina ocorrida no Forte Whiskey, uma estrutura de defesa construída pelos humanos em solo alienígena. Um pequeno grupo de soldados é encurralado numa emboscada por um imenso exército de insetos, que promovem um massacre devastador, numa sequência que rivaliza com a fantástica batalha no “Abismo de Helm” em “O Senhor dos Anéis: As Duas Torres” (2002), que mostra uma imensidão de flechas voando pelos ares e escadas cheias de orcs tentando invadir as estruturas de pedra de uma fortaleza guardada por humanos e elfos. E também com a cena de abertura de “O Resgate do Soldado Ryan” (1998), que mostra a invasão dos aliados na França, na costa da Normandia durante a Segunda Guerra Mundial, sendo recebidos à bala pelos alemães num massacre perturbador. Essas são três das mais intensas sequências de guerra produzidas pelo cinema, independente de ser ou não uma história de fantasia com personagens fictícios, ou a reprodução de um fato real e sangrento da história da humanidade, com destruidoras armas de fogo matando homens. Analisando exclusivamente como cinema de guerra, esses exemplos caracterizam o que mais próximo seria o horror de um campo de batalha. O inferno existe e é a guerra.
É curioso notar que “Tropas Estelares” também não deixa de explorar a rivalidade existente entre a infantaria e a frota, onde os primeiros são treinados exclusivamente para matar os inimigos ou morrer tentando, e já os pilotos são considerados como uma elite superior pela responsabilidade em conduzir as aeronaves. Uma frase indignada de Johnny Rico reforça bem essa ideia: “A infantaria morre enquanto a frota voa.”          

Com um orçamento em torno de US$ 100 milhões, o filme recebeu uma merecida indicação ao cobiçado prêmio “Oscar” pelos excelentes efeitos especiais, os quais levaram cerca de um ano para serem finalizados, entre a construção das belíssimas naves espaciais (sob a responsabilidade de Scott E. Anderson), e a criação do exército dos insetos alienígenas, dividido entre a infantaria (soldados), tanques (insetos de mais de 30 metros de comprimento), e a aeronáutica (insetos voadores), num precioso trabalho supervisionado por Phil Tippett. Os trabalhos com os efeitos visuais foram obtidos numa combinação de esforços entre as empresas “Sony Image Works”, “Industrial Light and Magic” e “Boss Film”.  
“Tropas Estelares” foi lançado em DVD no Brasil pela “Buena Vista Home Entertainment”, num disco repleto de interessante material extra em aproximadamente 30 minutos, e quase tudo legendado em português. Além de poder conferir o filme, temos acesso a vários bônus como um trailer; testes de duas cenas com os personagens Johnny Rico e Carmen Ibanez; uma apresentação com informações de bastidores da produção; um documentário com a elaboração de algumas cenas com comentários do diretor Paul Verhoeven, como a destruição de uma nave enorme num ataque dos insetos, a sequência onde Rico explode um inseto tanque, e a cena onde um soldado é perseguido e morto violentamente por um inseto; além de cinco cenas excluídas da edição final do filme. Como material extra ainda temos a exibição do filme com comentários em áudio do diretor, porém em inglês sem legendas.   

“O único inseto bom é um inseto morto.”

O diretor Paul Verhoeven nasceu em 1938, e em sua carreira destacam-se outros filmes interessantes como “Conquista Sangrenta” (1985), “Robocop” (1987), “O Vingador do Futuro” (1990), “Instinto Selvagem” (1992) e “O Homem Sem Sombra” (2000). Ele também dirigiu em 1995 “Showgirls”, muito criticado e considerado o seu pior trabalho.
O roteiro de “Tropas Estelares” é de Ed Neumeier, que também foi o autor da história de “Robocop”, inspirando uma franquia com mais três filmes e duas séries de TV. Ele utilizou como base para o filme o livro homônimo do escritor americano Robert A. Heinlein (1907 / 1988), um dos mais cultuados autores de Ficção Científica da história do gênero, figurando num grupo seleto formado ainda por Isaac Asimov e Arthur Clarke, entre outros nomes consagrados. Entre outros trabalhos importantes no cinema, Heinlein escreveu o roteiro do clássico de FC “Destino: Lua” (Destination Moon, 1950), baseado em sua própria novela chamada “Rocketship Galileo”.
O elenco é formado basicamente por jovens pouco conhecidos na época como Casper Van Dien, Denise Richards, Dina Meyer e Jake Busey, sendo liderados pela experiência de Michael Ironside, ator canadense nascido em 1950 e dono de um currículo com mais de 230 filmes, entre eles, “Scanners – Sua Mente Pode Destruir” (1981), de David Cronenberg, “Baile de Formatura 2” (1987), “O Vingador do Futuro”, “Highlander 2” (1991), e “Colheita Maldita 7” (2001), além da série televisiva “V – A Batalha Final” (1984).
Casper Van Dien é americano nascido na Florida em 1968, tendo uma filmografia com mais de 100 participações, e entre elas, no divertido filme “A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça” (1999), de Tim Burton. Denise Richards nasceu em 1971 no Estado americano de Illinois, e entre seus filmes estão “Garotas Selvagens” (1998), “007 – O Mundo Não é o Bastante” (1999) e o descartável thriller de horror adolescente “O Dia do Terror” (Valentine, 2001). Já Dina Meyer nasceu em 1968 em New York e entre seus filmes estão “Johnny Mnemonic” (1995), “Coração de Dragão” (1996), “D-Tox” e “Star Trek: Nêmesis” (ambos de 2002). E Jake Busey nasceu na California em 1971, sendo filho do veterano ator Gary Busey. Entre seus filmes podemos citar a comédia de horror “Os Espíritos” (1996), de Peter Jackson, a FC “Contato” (1997), e o excepcional thriller “Identidade” (2003). 

“Em todas as épocas os motivos para se lutar sempre foram do próprio Homem, mas no futuro a maior ameaça para a nossa sobrevivência não será o Homem. Agora a juventude do amanhã precisa viajar através das estrelas para encarar um inimigo muito mais devastador do que todos que já foram imaginados.”   

O início de uma franquia

O sucesso de “Tropas Estelares” acabou impulsionando uma franquia com várias produções. Tivemos uma série de animação produzida para a televisão em 1999 (“Roughnecks: The Starship Troopers Chronicles”) e o filme de animação “Tropas Estelares: Invasão” (2012). Além também do lançamento de duas continuações: “Tropas Estelares 2” (Starship Troopers 2: Hero of the Federation, 2004) e “Tropas Estelares 3” (Starship Troopers 3: Marauder, 2008).


“Tropas Estelares 2”
“Como consequência ao cruel ataque aracnídeo à Buenos Aires, forças federais aniquilaram o inimigo em Tango Urilla e capturaram um inseto inteligente no planeta P. Agora, armados com vitória, os heróicos homens e mulheres da infantaria móvel entram na zona de quarentena aracnídea e travam a luta contra o inseto.”
“Tropas Estelares 2” teve direção de Phil Tippett (um dos produtores e supervisor dos efeitos visuais dos insetos no filme original), e novamente roteiro de Edward Neumeier. O elenco foi formado por jovens desconhecidos como Richard Burgi, Colleen Porch, Bill Brown, Ed Quinn e Drew Powell, entre vários outros, exceto pelo veterano Ed Lauter, que interpretou um General. Curiosamente, a atriz Brenda Strong, que fez a Capitã Deladier no original, e que morreu na queda de sua nave num ataque dos insetos, voltou na continuação interpretando outro personagem, a Sargento Dede Rake.
A história do novo filme é ambientada cinco anos após os eventos do primeiro e acrescenta algumas novidades ao já conhecido universo ficcional dos insetos alienígenas, que agora são capazes de introduzir pequenas criaturas dentro dos corpos dos humanos, transformando-os em hospedeiros sob seu controle, com um plano de disseminar a praga no alto escalão militar da Federação. Eles ainda não foram dominados totalmente na guerra com a humanidade e as ações se passam dessa vez num remoto planeta, com mais algumas cenas de batalhas sangrentas.
Um pelotão da infantaria móvel é encurralado pelos insetos e se refugia num posto avançado que estava abandonado após uma batalha. Lá, eles se organizam para a defesa sob a liderança do General Jack Gordon Shepherd (Ed Lauter), enquanto aguardam um possível resgate aéreo. Entre os combatentes sobreviventes temos uma sensitiva, a soldado Lei Sahara (Colleen Porch), que tem visões pessimistas envolvendo os aracnídeos alienígenas. Por sorte, eles encontram no local, preso numa fornalha, o Capitão V. J. Dax (Richard Burgi), que fará o papel do herói do subtítulo original, na tentativa de deter um plano de contra-ataque dos insetos inimigos.
Infinitamente inferior, essa sequência foi produzida com bem menos recursos e sem a participação dos atores do filme original, resultando em menos cenas de batalhas, apesar de ainda ter boas doses de violência com mortes sangrentas. Porém, a história concentra-se quase que na totalidade num ambiente claustrofóbico de um posto avançado cercado pelos insetos, os quais dessa vez possuem um plano inteligente de contra-ataque. Até diverte um pouco se considerarmos como apenas mais um filme comum envolvendo elementos de guerra, horror e ficção científica. Mas, certamente se sustenta exclusivamente por trazer a marca “Tropas Estelares” no título, pois caso contrário estaria relegado ao limbo. Analisando como continuação, não tem como evitar um sentimento de decepção.      


“Tropas Estelares 3”
 “It´s a good day to die. When you know the reasons why. Citizen we fight for what is right.”
Em 2008 tivemos outra sequência, “Tropas Estelares 3”, numa co-produção entre EUA, Alemanha e África do Sul, que dessa vez além da autoria do roteiro, teve também a direção de Edward Neumeier, estreando no ofício. Além do retorno do ator Casper Van Dien do filme original, que depois de ser considerado um herói pela batalha vitoriosa no planeta P, trazendo como recompensa a captura de um cérebro inteligente dos insetos, subiu na hierarquia militar e transformou-se no agora Coronel Johnny Rico.
Ele comanda uma instalação militar na colônia de Roku San e recebe a visita do Delegado Espacial Omar Anoke (Stephen Hogan), que além de político influente na Federação, tem também muita popularidade como cantor de músicas que incitam o alistamento para a guerra contra os aracnídeos do espaço, como exemplificado na transcrição de um trecho no início do parágrafo. Ele está acompanhado do General Dix Hauser (Boris Kodjoe), antigo companheiro de Rico, e da Capitã Lola Beck (Jolene Blalock), que também conheceu Rico após os eventos do primeiro filme.
Depois de um violento confronto com os insetos na colônia de Roku San, onde os humanos foram aniquilados por causa de uma falha na cerca elétrica que os protegia na instalação militar, ocasionando uma invasão em massa dos inimigos, Rico foi injustamente considerado culpado pela derrota e encaminhado para uma prisão. Porém, uma vez resgatado da forca pelo General Hauser, ele é convocado para liderar uma equipe especial de pilhagem (o “Marauder” do subtítulo original), numa missão secreta de resgate no planeta OM-1, dominado pelos insetos, e cujos resultados de extrema importância política poderiam mudar os rumos da guerra, envolvendo a tirania da Almirante Enolo Phid (Amanda Donohoe) e questões de manipulação religiosa.  
Com uma produção bem melhor e história mais desenvolvida, essa parte 3 da franquia representa aquilo que a parte 2 falhou. Ou seja, um filme com a participação de algum personagem importante do original (o agora Coronel Rico), apresentando mais relações com o primeiro filme (tem até a participação do cérebro alienígena capturado), e mais cenas de batalhas sangrentas com naves cruzando o espaço. É verdade que tem várias questões que também incomodaram como o exagero nas propagandas políticas militares, as trapalhadas do jovem General Hauser como soldado, nitidamente mais à vontade como político, a cansativa discussão religiosa no meio do caos da guerra, novamente com objetivos puramente políticos e manipuladores, e a cena final carregada de pieguice. Mas, apesar disso, ainda é um filme que conseguiu contribuir e agregar valores para o universo ficcional de “Tropas Estelares”, algo que a parte 2 não conseguiu, sendo apenas mais um filme comum e cheio de clichês. 
“Eu gosto de insetos fritos pela manhã.” – frase da Tenente Link Manion (Cécile Brecia), antes do massacre em Roku San.


“Tropas Estelares: Invasão”
“Um brinde aos mortos e aos que ainda morrerão.”
Numa co-produção de 2012 entre Estados Unidos e Japão, essa animação dirigida pelo japonês Shinji Aramaki apresenta os três personagens principais do filme original, Johnny Rico, Carmen Ibanez e Carl Jenkins, que se formaram juntos na academia e tiveram destinos diferentes na guerra, construindo cada um ao seu modo carreiras militares de destaque. Enquanto Rico foi para a infantaria e após muitas batalhas e sangue derramado tornou-se General, a bela Ibanez tornou-se piloto da frota e capitã da nave John A. Warden, e o sensitivo Jenkins juntou-se à elite da Federação como Ministro de Guerra Paranormal.
Com ambientação quase que totalmente em naves espaciais, o roteiro dessa animação mostra inicialmente uma missão de resgate da nave Alesia ao Fort Casey, localizado num asteroide, que foi brutalmente atacado pelos insetos. Chegando lá, eles encontram um cenário de destruição e o comandante local Major Henry Varro, também conhecido como “Hero”, está preso por insubordinação, num envolvimento conturbado com um segredo misterioso. O motivo é um projeto clandestino liderado por Carl Jenkins, que se apossou da nave da capitã Ibanez para uma missão secreta. Porém, depois que a comunicação com a nave é perdida, descobriu-se que estava sendo controlada por uma poderosa rainha dos insetos, com rota para a Terra. Formou-se então outra missão de resgate para averiguar o mistério, dessa vez contando também com o apoio do General Rico para impedir um ataque ao nosso planeta.
Não faltam tiroteios e batalhas sangrentas com os insetos, principalmente no interior de naves estelares. A história é bem movimentada, com grandes doses de violência e todos os elementos característicos de guerras espaciais que fizeram “Tropas Estelares” conquistar uma imensa legião de fãs, com soldados truculentos e determinados, homens e mulheres concentrados na luta pela sobrevivência num conflito sangrento contra insetos alienígenas invasores, exaltando a disciplina militar como modelo político. “Tropas Estelares: Invasão” é uma animação que diverte bastante e consegue honrar o filme original.
Curiosamente, vale a pena conferir uma cena rápida após os créditos finais envolvendo um inseto solitário caminhando num túnel de esgoto.

“Tropas Estelares” (Starship Troopers, 1997) – avaliação: 9 (de 0 a 10)
(postado em 27/01/06) (revisado em 19/01/16)

Tropas Estelares (Starship Troopers, Estados Unidos, 1997). Touchstone / Tristar. Duração: 119 minutos. Direção de Paul Verhoeven. Roteiro de Ed Neumeier, baseado em livro homônimo de Robert A. Heinlein. Produção de Alan Marshall, Jon Davison, Frances Doel, Stacy Lumbrezer, Ed Neumeier e Phil Tippet. Música de Basil Poledouris. Fotografia de Jost Vacano. Edição de Mark Goldblatt e Caroline Ross. Desenho de Produção de Allan Cameron. Elenco: Casper Van Dien (Johnny Rico), Dina Meyer (Dizzy Flores), Denise Richards (Carmen Ibanez), Jake Busey (Ace Levy), Neil Patrick Harris (Carl Jenkins), Patrick Muldoon (Zander Barcalow), Michael Ironside (Tenente Jean Rasczak), Clancy Brown (Sargento Zim), Seth Gillian (Sugar Watkins), Rue McClanahan (Professora de Biologia), Marshall Bell (General Owen), Anthony Ruivivar (Shujumi), Dale Dye (General), Eric Bruskotter (Breckinridge), Matt Levin (Kitten Smith), Blake Lindsley (Katrina McIntire), Brenda Strong (Capitã Deladier), Dean Norris (Major), Christopher Curry (Bill Rico), Lenore Kasdorf (Sra. Rico), Tami-Adrian George, Steven Ford, Ungela Brockman.